terça-feira, 13 de janeiro de 2015

PEDRO CONFESSA JESUS COMO O MESSIAS

                               PEDRO CONFESSA JESUS COMO O MESSIAS
                            MATEUS 16:13-20      (Marcos 8:27-30; Lucas 9:18-21)

Quando Jesus se retirou da região de Magadã (Dalmanuta) e passou para o outro lado do lago e, chegando a Betsaida, Ele mostrou a intenção de prosseguir para Cesaréia de Filipe. Ali deviam acontecer cousas importantes no ensino e na preparação dos discípulos para o futuro ministério deles. Havia cousas que eles ainda não compreendiam e não podiam suportar. Havia outras cousas que eles precisavam aprender.
A região escolhida pelo Mestre para esta etapa do Seu ministério junto aos discípulos ficava cerca de quarenta e seis quilômetros a oeste do Mar da Galiléia. Era o lugar ideal para o Seu propósito. Ali eles estavam fora do domínio de Herodes, longe dos partidários desse rei e das multidões que O seguiam costumeiramente. A maior parte da população local era constituída de não-judeus. Portanto, Ele sentia-se livre para dar instruções aos doze.
O texto não informa se Ele entrou naquela cidade que ficava trinta e sete quilômetros ao norte de Betsaida, na encosta sudoeste do Monte Hermon (2.773 m de altura), no sopé do qual a uma grota de incrível profundidade, de onde emergem copiosas águas que se juntam a outras duas correntes que formam o rio Jordão.
Aquele território era associado ao culto do deus Baal dos Sírios, que tinha ali uma grande quantidade de templos construídos, havia muito tempo. Uma lenda dizia que o deus Pam, deus da natureza, havia nascido ali numa caverna muito profunda, ao sopé de uma montanha muito alta que se eleva abruptamente. Até os judeus mais piedosos tinham grande admiração por aquela região, porque ali se localizava uma das nascentes do rio Jordão.
Para aumentar a importância do lugar, o rei Herodes, o Grande, construiu naqueles mananciais um enorme templo de mármore branco, dedicado ao culto do imperador César Augusto. Mas tarde, Filipe, o tetrarca, filho deste Herodes, embelezou ainda mais o templo e trocou o nome “Cidade de Pam” para “Cesaréia de Filipe”, para distingui-la da outra Cesaréia, à margem do Mediterrâneo. Com  isto, ele quis homenagear o imperador Tibério César. Assim, aquela cidade tornou-se memorial do poderio de Roma e da divindade do imperador.
Foi dentro deste cenário de belezas naturais tão contrastantes, santuário de deuses pagãos, de misticismo religioso tão irraigado e de tradição política tão evidente, que Jesus se colocou com seus discípulos para questioná-los sobre um assunto muito importante, que é a Sua identidade. Ele queria que seus discípulos expusessem o conceito que faziam d’Ele, uma vez que o povo em geral não O compreendia satisfatoriamente.

V.13 – Indo Jesus para as bandas de Cesaréia de Filipe, perguntou a seus
           discípulos: Quem diz o povo ser o Filho do homem?
V.14 – E eles responderam: Uns dizem: João Batista, outros: Elias; e outros:
           Jeremias, ou algum dos profetas.

Caminhando pela região de Cesaréia, num intervalo em que estava em oração (Lucas 9:18), Ele perguntou aos discípulos: “Quem diz o povo ser o Filho do homem?” Embora a expressão Filho do homem tenha significado messiânico em Daniel 7:13 fica claro que no V.13 Jesus não está utilizando-a com esse sentido. Caso contrário, Ele estaria induzindo os discípulos a responderem como Pedro respondeu no V.16. Neste caso, Ele estaria respondendo à Sua própria pergunta do V.15. Primeiramente, Ele queria saber o que os discípulos ouviram do povo naquela campanha missionária que eles fizeram por todo o território de Israel.
A resposta colhida pelos discípulos sobre a opinião popular a respeito de Jesus não está fora da crença vulgar da época, pois o judaísmo acreditava na possibilidade dos mortos voltarem a vida, como confirmam os livros apócrifos (II Macabeus 15:13ss, II Esdras 2:18). Embora não sejam identificadas as fontes que opinaram a respeito de quem era o Filho do homem, há quatro opiniões colhidas pelos discípulos a Seu respeito, imaginando que Ele fosse algum vulto do passado, que tivesse ressuscitado:

1 – Ele seria João Batista, de conformidade com o pensamento de Herodes
      Antipas (Marcos 6:16).
2 – Ele seria Elias, o esperado precursor que viria preparar o caminho para a
      chegada do Messias (Malaquias 3:1; 4:5).
3 – Ele seria Jeremias, depoimento registrado apenas por Mateus. Algum judeu
      piedoso que conhecesse a vida daquele profeta que nunca foi acreditado, e
      que passou por muitos sofrimentos, poderia ver em Jeremias, o tipo de
      Jesus, como o servo sofredor (comparar Jeremias 3:21-26; 37:15, 20-21;
      38:7-13 com Isaías 53:1-3).
4 – Ele seria um dos antigos profetas ressuscitado.

É verdade que a característica comum apontada por todo o povo é a de profeta (cf Lucas 4:24; João 4:44). Mas isto não diz tudo. Ele é maior do que todos os profetas, inclusive Moisés (Atos 3:22-23; Hebreus 3:3). A expressão usada por Jesus no Sermão da Montanha: “Ouvistes o que foi dito (aos antigos)... Eu porém vos digo...”. (Mateus 5:21-22, 27-28, 33-34 etc). Mostra que a Sua autoridade para interpretar a Lei é a mesma do Pai.
O argumento do povo era baseado em especulações, porque eles não tinham experiência de vida com o Mestre. Essa avaliação era imprecisa e pouco racional, mostrando desde solidariedade, medo e aversão, até respeito. Mas os discípulos, necessariamente precisam ter um conceito mais elevado e um conhecimento mais desenvolvido a respeito do seu Mestre.

V.15 – Mas vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou?
V.16 – Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.

A pergunta feita, agora, aos discípulos é enfática e incisiva, porque pretende contrastar a opinião deles com a opinião geral dos homens. Isto fica implícito no uso da expressão “Mas vós”. É um desafio lançado aos doze, que exige uma resposta diferente e superior àquela dada pelas multidões. A única resposta cabível foi esta dada por Pedro, o porta-voz dos doze: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Esta era a resposta esperada e foi perfeita. A expressão “o Cristo” atinge a profecia messiânica de Daniel 7:13 e a expressão “Filho do Deus vivo” contrasta o Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, com os deuses pagãos mortos. O Deus vivo é aquele que age no meio dos homens (Deuteronômio 5:25; Josué 3:10; Daniel 6:20; I Timóteo 3:15). Aquele ambiente de tradição pagã tão evidente tem a ver com o propósito de Jesus extrair dos discípulos aquela confissão que exprime o conceito que eles foram levados a adquirir a Seu respeito, depois daqueles anos de convivência com Ele.
Marcos registra a confissão de Pedro, dizendo: “Tu és o Cristo”, isto é, “o Ungido” ou “o Messias”. Lucas registra: “O Cristo de Deus” ou seja “O Ungido de Javé” (cf Marcos 8:29; Lucas 9:20).

V.17 – Então Jesus lhe afirmou: Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque
            não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai que está nos céus.
V.18 – Também te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha
            igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.

A revelação de Pedro a respeito de Jesus não foi via carne e sangue, o que significa que não foi uma informação recebida de outra pessoa, como Paulo afirma em Gálatas 1:11-12: “...o evangelho por mim anunciado não é segundo homem, porque não o recebi, nem o aprendi de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo”. Também, não foi por qualquer sentimento humano que o levasse a reverenciar Jesus com aquelas palavras. Foi por via espiritual que Deus o convenceu de quem era Aquele que o chamou na praia para ser pescador de homens (cf 4:18; Lucas 5:8-9). De lá para cá, foi uma longa caminhada, durante a qual ele viu, ouviu e aprendeu do Mestre tudo o que Deus preparou para que ele chegasse a essa convicção.
Essa revelação de Deus é fundamental para a vida da igreja. Pedro foi aclamado por Jesus “Bem-aventurado”, por recebê-la. E todo crente verdadeiro é detentor desta bem-aventurança, garantida pelo Cristo.
Para compreender o V.18 antes de tudo, é necessário entender o jogo de palavras que Jesus faz com o nome de Pedro (Petros, no grego) e a palavra “pedra” (petra, no grego). “Petros” é usado no Novo Testamento como nome do apóstolo, muitas vezes em conexão com o seu nome original “Simão” (Simön, no Grego), tornando-se “Simão Pedro” (cf João 1:40-42). O significado de “petros”, no Grego, é de uma pedra pequena ou de uma lasca de pedra, que se pode manusear com facilidade, e corresponde a “Cefas” no aramaico, língua falada em Israel nos tempos do Novo Testamento. Já a palavra “pedra” (petra, no Grego) tem o significado de uma rocha sólida, de grande porte, como é compreendido tanto no Novo Testamento, referindo-se a Jesus (cf Mateus 7:24; 27:51, 60; Romanos 9:33), como no Velho Testamento, referindo-se a Jeová (Isaías 17:10; 26:4; 30:29). Como pedra ou rocha fundamental da igreja, Jesus é descrito em I Coríntios 3:11; Efésios 2:20; I Pedro 2:4-8.
Estas passagens mostram que, interpretar a igreja como estabelecida sobre a pessoa de Pedro é uma exegese falsa, sem fundamento bíblico, além de representar uma afronta à pessoa e a obra de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. A igreja foi estabelecida sobre a rocha (petra no Grego) que é Cristo. Para maior esclarecimento do assunto, veja a discussão sobre “petra” e “petros” no dicionário do Novo Testamento Grego de William Carey Taylor, publicado pela Casa Publicadora Batista, edição Juerp.
A palavra “igreja” (Ekklësia no Grego) é usada aqui, pela primeira vez por Jesus, na história do Novo Testamento, numa fase em que ela ainda não existia. Era, portanto, uma promessa que se cumpriu no dia de Pentecoste, poucos dias depois da sua ascensão ao céu (Atos 1:6-11; 2:1-47). Assim mesmo, a palavra só veio a ser usada novamente em Atos 5:11, nas cartas mais antigas do Novo Testamento (Tiago 5:14; Gálatas 1:2, 13, 22) e, posteriormente, de modo mais amplo nas outras cartas apostólicas, até o Apocalipse.
O significado da palavra “igreja” é de uma assembleia, ou ajuntamento do povo de Deus, sendo usada para a reunião dos cristãos, do mesmo modo que “sinagoga” é usada para a reunião dos judeus. Estas duas palavras têm origem na Septuaginta que é a tradução do Velho Testamento Hebraico para o Grego, feita em torno do ano 300 A.C.. Nesta versão, as palavras hebraicas “edah” e “kahal”, que significam a assembleia, reunião ou ajuntamento do povo ou dos seus representantes, foram traduzidas por “Ekklësia” e “sunagogë”, indistintamente. Os apóstolos adotaram a primeira para a reunião dos cristãos, ou seja, a igreja, restando a segunda, para a reunião dos judeus que é a sinagoga.
A afirmação de Jesus que as portas do inferno não prevaleceriam sobre ou contra a igreja que Ele estava para edificar, precisa ser bem esclarecida. A palavra “inferno”, aqui, é tradução de “hadës” do Grego, que significa o mundo dos mortos, o além-túmulo. Daí surgem duas interpretações. Uma delas afirma a perpetuidade da igreja, ou seja, que ela não será destruída até que seja arrebatada pelo Senhor. A outra é a interpretação que o hades não poderia deter Jesus na morte, impedindo-O de edificar a Sua igreja. As duas interpretações são possíveis e verdadeiras. Mas, ao que parece, de acordo com o contexto, a segunda é preferível, porque logo em seguida, no V.21, Ele anuncia a Sua morte e ressurreição (cf Atos 2:24, 27).
Esta interpretação concorda com João 2:19 em que Ele fala da Sua ressurreição e da reconstrução do santuário do Seu corpo. Esta reconstrução do santuário do Seu corpo é entendida como a edificação da igreja que é o seu corpo.
V.19 – Dar-te-ei as chaves do reino dos céus: o que ligares na terra, terá sido
            ligado nos céus; e o que desligares na terra, terá sido desligado nos céus.
V.20 – Então advertiu os discípulos de que a ninguém dissessem ser ele o Cristo.

As chaves prometidas a Pedro são símbolo da atuação que ele teria no reino dos céus, prestes a ser implantado. Jesus conhecia o caráter desse apóstolo, sua intrepidez, sua fibra, apesar das suas imperfeições. Chaves são figura de autoridade, símbolo já conhecido no Velho Testamento (Isaías 22:22), e mencionado em Apocalipse 1:18; 3:7. É evidente que a autoridade, ou as chaves, pertencem a Cristo. Mas Ele as confiou a Pedro em primeira mão, e, depois, aos demais apóstolos (18:18). Em outras palavras, eles teriam  autoridade para (ligar e desligar), ou seja, para dizer qual é o procedimento aceitável ou não, daqueles que querem sujeitar-se ao governo de Deus e à Lei de Cristo. Neste sentido, Pedro teve o privilégio de abrir as portas do reino para os judeus, dando início à igreja em Pentecoste (Atos 2:14-47) e, também, dando início à primeira igreja entre os gentios, na casa de Cornélio (Atos 10).
A divulgação da conclusão a que eles chegaram, que Jesus é o Messias, podia ainda excitar o povo, levando-o a uma rebelião contra o domínio romano no país. Este é o motivo de Jesus ter advertido os discípulos para não dizerem nada a ninguém sobre esta verdade.
O episódio da confissão de Pedro é relatado por Marcos e Lucas, de maneira muito sucinta. Marcos registra laconicamente que Pedro disse: “Tu és o Cristo”. Esta era a conclusão lógica a que os discípulos deviam chegar, de acordo com o plano que o evangelista traçou para o seu Evangelho, segundo o qual ele registrou uma sequencia de milagres anteriores ao episódio de Cesaréia de Filipe, de modo que os discípulos chegassem necessariamente à compreensão de que Jesus é o Cristo, isto é, o Messias. Daí, as poucas palavras que Ele coloca na boca de Pedro. Lucas não dá ênfase às circunstâncias geográficas, históricas e ambientais do caso, mas enfatiza o fato de Jesus estar em oração (9:18) e os discípulos, presentes com ele, apontando para a importância da oração no ministério do Messias.