OS FARISEUS INTERROGAM O CEGO
JOÃO 9:13-34
V.13 – Levaram, pois, aos fariseus o que dantes fora cego.
V.14 – E era sábado o dia em que Jesus fez o lodo e lhe abriu os olhos.
V.15 – Então os fariseus por sua vez lhe perguntaram como chegara a ver; ao que
lhes respondeu: Aplicou lodo aos meus olhos, lavei-me e estou vendo.
V.16 – Por isso alguns dos fariseus diziam: Esse homem não é de Deus, porque
não guarda o sábado. Diziam outros: Como pode um homem pecador
fazer tamanho sinais? E houve dissensão entre eles.
V.17 – De novo perguntaram ao cego? Que dizes tu a respeito dele, que te abriu
os olhos? Que é profeta, respondeu ele.
Quem levou aos fariseus o homem que antes era cego, provavelmente foram os seus vizinhos e outros que o viam mendigando antes de ser curado, visto que não há outros envolvidos na história. O evangelista explica que a cura foi feita no sábado, para justificar a hostilidade dos fariseus contra Jesus.
As autoridades judaicas ficaram interessadas no caso, porque a cura de um cego de nascença era algo sem precedentes na história. A falta de recursos médicos na época e a repercussão do fato no meio de uma população maravilhada diante de um acontecimento tão surpreendente indicava a necessidade de uma investigação cuidadosa. Para aqueles judeus, tudo não passava de hipótese de uma cura pretensamente milagrosa.
O primeiro passo da investigação dos fariseus foi pedir explicações ao próprio ex-cego. Ele os atendeu, mas respondeu com palavras mais breves do que quando falou aos vizinhos e aos que dantes o conheciam de vista como mendigo (V.11). As suas poucas palavras, ditas com convicção, bastaram para criar uma dissensão entre os fariseus. Uns acusavam Jesus de não ser homem de Deus, porque violava o sábado. Outros afirmavam que um homem pecador não tem poder para fazer tamanhos sinais.
Os motivos para o primeiro grupo afirmar que Jesus não guardava o sábado são os seguintes:
1 – Jesus amassou terra e saliva com os dedos para fazer lodo e aplica-lo aos olhos do cego. Todo esses movimentos eram considerados trabalho (esforço), proibido pela Tradição dos Anciãos, no que se refere ao sábado.
2 – Por essa mesma lei, era proibido curar no sábado. Só em caso de extremo risco de vida era permitido atender a um paciente. Mas não era permitido nenhum tratamento que viesse a piorar a saúde do doente e, muito menos, que melhorasse o seu estado.
3 – Havia, também, complicadas disposições a respeito do uso da saliva para fins terapêuticos aos sábados.
Estes, e muitos outros preceitos da lei tradicional dos judeus, eram produto de interpretação humana, que Jesus nunca reconheceu e aos quais nunca se submeteu.
Prosseguindo nas investigações, voltaram os fariseus a interrogar o que fora cego, desta vez para colher o seu depoimento a respeito do “homem chamado Jesus”. Então perguntaram enfaticamente: “Que dizes tu a respeito dele, visto que te abriu os olhos?”. A sua resposta mostra o crescimento do seu conceito a respeito da pessoa de Jesus, porque ele disse: “... é profeta”. Ele sabia que Elias e Elizeu operaram grandes milagres em Israel (cf I Reis 18:38-39; II Reis 5:14). A partir desse momento, cresceram as hostilidades dos judeus contra aquele homem.
V.18 – Não acreditaram os judeus que ele fora cego e que agora via, enquanto
não lhe chamaram os pais,
V.19 – e os interrogaram: É este o vosso filho, de quem dizeis que nasceu cego?
como, pois, vê agora?
V.20 – Então os pais responderam: Sabemos que este é nosso filho, e que nasceu
cego;
V.21 – mas não sabemos como vê agora; ou quem lhe abriu os olhos também não
sabemos. Perguntai a ele, idade tem; falará de si mesmo.
O próximo passo da investigação dos judeus foi a entrevista com os pais do que fora cego, e lhes pediram a confirmação de que ele realmente era filho deles, e se ele nascera cego. Os pais confirmaram estes fatos. Mas a próxima pergunta “como pois vê agora?” deixa dúvida se eles realmente não sabiam. É difícil imaginar que o rapaz não lhes tenha falado de Jesus, e de como ele o tratou para ser curado. Provavelmente, por estar diante de autoridades antagônicas a Jesus, e por conhecer a opinião de muitos judeus a respeito d’Ele (cf 7:58-59), os pais assumiram uma postura isenta de compromisso, sem tocar no nome de Jesus. Antes, remeteram os entrevistadores ao seu filho, alegando que ele tinha idade suficiente para dar depoimento diante das autoridades. A lei Judaica exigia a idade mínima de 13 anos para isso.
V.22 – Isto disseram seus pais porque estavam com medo dos judeus; pois estes
já haviam assentado que se alguém confessasse ser Jesus o Cristo, fosse
expulso da sinagoga.
V.23 – Por isso é que disseram os pais: Ele idade tem, interrogai-o.
Estes versos explicam porquê os pais foram cautelosos ao dar informações sobre a cura do filho. Os judeus, que aqui são os líderes incrédulos, especialmente os fariseus, haviam concordado em abafar energicamente qualquer tentativa de reconhecer e confessar Jesus como o Cristo. Consequentemente, qualquer pessoa que fizesse isso seria expulsa (excomungada) da sinagoga. Esta drástica resistência contra Jesus diz respeito, primariamente, a Jerusalém. Isto mostra o que já havia ficado claro nos capítulos 7 e 8, quando o povo falava de Jesus e as multidões ficavam divididas (7:12-13, 25-26,31; 8:30).
V.24 – Então chamaram pela segunda vez o homem que fora cego e lhe disseram:
Dá glória a Deus; nós sabemos que esse homem é pecador.
V.25 – Ele retrucou: Se é pecador, não sei; uma cousa sei: Eu era cego, e agora vejo.
V.26 – Perguntaram-lhe pois: Que te fez ele? Como te abriu os olhos?
V.27 – Ele lhes respondeu: Já vo-lo disse, e não atendestes; por que quereis
ouvir outra vez? Porventura quereis vós também tornar-vos seus discípulos?
Os judeus, vendo-se impossibilitados de por em dúvida o fato da cura do homem que fora cego, chamaram-no pela segunda vez, para tentar fazê-lo conformar-se com as suas ideias a respeito de Jesus. Então, com a máscara da autoridade, lhes disseram: “Dá glória a Deus; nós sabemos que este homem é pecador”. Em outras palavras, eles estavam intimidando-o a jurar que falaria a verdade, como se estivesse na presença de Deus, concordando que Jesus era pecador (cf Josué 7:19). Os judeus afirmavam: “nós sabemos que esse homem é pecador”. Ele replicou dizendo: “Se é pecador, não sei”. Quanto ao juramento de falar a verdade, ele deu o resumo, dizendo: “Eu era cego e agora vejo”.
A reação dos judeus ao testemunho do homem foi insistir na pergunta do que Jesus havia feito, e como lhe abriu os olhos. É a mesma pergunta anterior (V.10), mas agora, feita de modo diferente. Aqui houve um revanche, quando os judeus foram censurados por não prestar atenção às informações dadas anteriormente pelo ex-cego (V.11). O pior de tudo foi a pergunta daquele homem: “porventura quereis vós também tornar-vos seus discípulos?”
V.28 – Então o injuriaram e lhe disseram: Discípulo dele és tu, mas nós somos
discípulos de Moisés.
V.29 – Sabemos que Deus falou a Moisés, mas deste nem sabemos donde é.
Sentindo-se feridos por esse golpe de contra-ofensiva, os judeus recorreram ao passado e à tradição, dizendo que eram discípulos de Moisés, enquanto aquele homem era discípulo de Cristo. Com isto eles afirmavam ser fiéis intérpretes da Lei, pois Deus tinha falado a Moisés, o que é premissa fundamental das Escrituras. Eles afirmavam não somente que Jesus era um herege desconhecido, mas também que estava aliciando pessoas do povo, como aquele ex-cego, para serem seus discípulos.Sobre Jesus, eles afirmavam que não conheciam a Sua origem(7:27,41,53; 8:19).
V.30 – Respondeu-lhes o homem: Nisto é de estranhar que vós não saibais donde
ele é, e contudo me abriu os olhos.
V.31 – Sabemos que Deus não atende a pecadores; mas, pelo contrário, se
alguém teme a Deus e pratica a sua vontade, a este atende.
V.32 – Desde que há mundo, jamais se ouviu que alguém tenha aberto os olhos a
um cego de nascença.
V.33 – Se este homem não fosse de Deus, nada poderia ter feito.
V.34 – Mas eles retrucaram: Tu és nascido todo em pecado, e nos ensinas a nós?
E o expulsaram.
Agora, com a situação revertida, o que fora curado, espantado por ver como os judeus rejeitavam as evidências da cura operada por Jesus, passa a reprimir os judeus, denunciando o falso fundamento das suas convicções. Para o ex-cego, o fato de Jesus ter-lhe aberto os olhos devia ser suficiente para eles deduzirem de onde Ele era. Aquele fato sem precedentes na história, tanto da humanidade, como na História Sagrada de Israel (Velho Testamento), só podia ter sido operado por Deus. E, se é sabido que Deus não atende a pecadores, mas atende aos verdadeiros adoradores que fazem a sua vontade, não havia razão para eles imaginarem que Jesus fosse pecador e que Ele não viesse de Deus.
Depois de ter disparado contra seus adversários, e de usar a sua própria teologia para desbaratá-los da posição de doutores, o último recurso do seu arsenal foi tentar dar ensino àqueles mestres oficiais da lei tradicional. Eles ficaram muito irados com esse desaforo, mas, incapazes de responder à lógica dos seus argumentos, condenaram-no como totalmente depravado, isto é, nascido em pecado, cousa que Jesus não admitiu (V.3). Eles queriam dizer que, nestas condições, ele não podia ensinar aqueles líderes religiosos. Então o expulsaram da sinagoga.
A excomunhão era uma medida muito severa e muito temida pelos judeus, porque podia vigorar para o resto da vida. Constava de maldição pronunciada publicamente sobre o excomungado, diante de todo o povo, e o excluía da presença de Deus e dos homens. A possibilidade de receber tal sentença causava verdadeiro terror ao povo de Israel. Isso foi o que causou medo aos pais do ex-cego e os levou a dar um depoimento cauteloso diante dos judeus (Vs.20-23).