AS INSTRUÇÕES PARA OS DOZE
MATEUS 10:1, 5-15 (Marcos 6:7-13; Lucas 9:1-6)
V. 1 – Tendo chamado os seus doze discípulos, deu-lhes Jesus autoridade sobre
espíritos imundos para os expelir, e para curar toda sorte de doenças e
enfermidades.
V.2-4 A respeito dos nomes e das características dos apóstolos, veja o
comentário de Marcos 3:13-19, sob o título “A Escolha dos Doze
apóstolos.
V. 5 – A estes doze enviou Jesus, dando-lhes as seguintes instruções: Não
tomeis rumo aos gentios, nem entreis em cidade de samaritanos;
V. 6 – mas, de preferência, procurai as ovelhas perdidas da casa de Israel;
Entre os muitos discípulos de Jesus havia um grupo de 12 que se tornou conhecido por esse número, antes mesmo de receberem a incumbência do apostolado. Mateus usou a palavra “apóstolos” para referir-se a eles uma única vez em todo o seu Evangelho (10:2). Nas outras vezes chamou-os de “doze discípulos” ou simplesmente “os doze” (11:1; 20:17; 26:14, 20, 47). Mas nos escritos do Novo Testamento, quem primeiro se referiu a eles com esse epíteto foi o apóstolo Paulo, ao escrever aos Coríntios a sua primeira carta, em 57 D.C., antes de terem sido escritos os Evangelhos (I Coríntios 15:5).
O que se destaca no início da narrativa de Mateus é a autoridade que Jesus lhes deu para expelir espíritos imundos e para curar toda sorte de doenças e enfermidades. Isto corresponde acontinuidadedo trabalho do Mestre realizado no Seu ministério de obras e palavras, de agora em diante ampliados através destes que foram chamados e devidamente autorizados para O representarem nesse treinamento inicial em Israel.
Marcos informa que Jesus os enviou dois a dois (6:7). Embora Mateus não diga isto explicitamente, ele o deixa transparecer, separando as duplas por meio de uma vírgula no texto grego original, que corresponde a um ponto e vírgula no texto em Português. O fato de estarem dois juntos, fortalecia o testemunho deles diante do povo que iriam encontrar (Deuteronômio 19:15b; Mateus18:16).
A ordem de Jesus aos apóstolos para não tomarem rumo aos gentios e para não entrarem em cidade de samaritanos não significa nenhum preconceito e, muito menos, rejeição do Mestre aos estrangeiros. Efetivamente, trata-se de uma medida oportuna e prática. Oportuna, porque o povo de Deus estava extremamente carente de ajuda espiritual, como Jesus aponta em 9:36. Eles haviam sido abandonados e estavam vagando sem rumo, guiados por pastores infiéis (Jeremias 50:6, 17; Ezequiel 34:2-6ss). Além disso, aquele era o povo da Aliança e aguardava a vinda do Messias, a esperança de Israel, o qual trazia consigo o reino de Deus (Isaías 49:6; Daniel 7:12-14; Mateus 12:28).
A medida era prática no sentido de que se tratava de um primeiro treinamento dos discípulos, que conheciam bem os costumes dos judeus, mas ainda não estavam preparados para enfrentar o mundo gentílico. Isto só aconteceu mais tarde, com o poder desencadeado pela ressurreição de Cristo, e pela descida do Espírito Santo em Pentecoste. Nesta ocasião eles foram habilitados para um ministério mundial mais abrangente (Atos 1:8; Efésios 4:8,11). A obra missionária dos apóstolos só poderia ser bem sucedida, se respeitado o plano divino que incluía o sacrifício de Cristo na cruz, para a derrubada da parede de separação, isto é, a inimizade entre judeus e gentios, a fim de que estes fossem aproximados de Deus, formando um só corpo que é a igreja, para habitação de Deus no Espírito. O fundamento da igreja é exatamente o ensino dos apóstolos e profetas de Cristo, sendo Ele mesmo a pedra angular (Efésios 2:11-22).
V. 7 – e, à medida que seguirdes, pregai que está próximo o reino dos céus.
V. 8 – Curai enfermos, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expeli demônios;
de graça recebestes, de graça dai.
O ministério dos apóstolos era do mesmo teor do de Jesus. Consistia de pregação da chegada iminente do reino dos céus, com os sinais comprobatórios que são: cura de enfermos, ressurreição de mortos, purificação de leprosos, expulsão de demônios. Para isto eles receberam poder e autoridade do Senhor (10:1; Lucas 9:1). Eles eram autênticos representantes do Mestre. Se d’Ele receberam de graça toda essa autoridade, nada deviam cobrar pelo exercício dela, seja no que concerne à pregação, ao ensino ou aos milagres. Marcos informa que os discípulos usavam a unção com óleo na cura de enfermos (6:13).
V. 9 – Não vos provereis de ouro, nem de prata, nem de cobre nos vossos
cintos;
V.10 – nem de alforje para o caminho, nem de duas túnicas, nem de sandálias,
nem de bordão; porque digno é o trabalhador do seu alimento.
As restrições ordenadas por Jesus quanto ao porte de dinheiro (ouro, prata, cobre) nos cintos visava desviar-lhes a atenção da obtenção de lucro através do ministério. Quanto ao porte de alforjes (mochilas) para carregar alimentos e o porte de vestuário supérfluo visava dirigir-lhes a atenção para a urgência do encargo que receberam e não se preocuparem com o excesso de preparativos e de cargas para transportarem. O V.10 não proíbe o uso de sandálias nos pés, mas de “levar” na bagagem um outro par além do que usavam (Marcos 6:8). As túnicas, peças usadas logo em cima da pele, eram geralmente oferecidas pelos hospedeiros dignos. A proibição de bordão era para evitar que fiassem apoiados sobre ele quando, eventualmente, encontrassem conhecidos nos cruzamentos das rotas de percurso, ocasião em que as conversas se prolongavam por muito tempo. Lucas 10:4 sugere que estes doze apóstolos, por esta mesma razão, não deviam saudar alguém pelo caminho. Marcos não faz restrição ao uso do bordão por uma questão cultural (6:8). É porque esta peça fazia parte da postura digna de um cidadão romano, pois o seu Evangelho foi escrito para aquele povo.
Ao dar restrições aos apóstolos, Jesus não estava fazendo nada fora do comum, pois Ele sabia que seus enviados contariam com a ajuda de pessoas solidárias que reconheciam o valor desse ministério. Por isso disse: “... digno é o trabalhador do seu alimento”. A hospitalidade era um costume tradicional, especialmente entre os judeus, visto que não havia hotéis naquela época como há hoje em dia (I Pedro 4:9).
V.11 – E em qualquer cidade ou povoado em que entrardes, indagai quem neles
é digno; e aí ficai até vos retirardes.
V.12 – Ao entrardes na casa, saudai-a;
V.13 – Se, com efeito, a casa for digna, venha sobre ela a vossa paz; se porém
não o for, torne para vós outros a vossa paz.
Os apóstolos deviam tomar medidas de precaução ao chegarem em uma cidade ou povoado. Antes de aceitar oferta para hospedagem, deviam informar-se de quais pessoas eram dignas, isto é, pessoas disposta a recebê-los e a cooperar com eles. Seria constrangedor para aquele serviço apostólico permanecer com pessoas de má vontade ou que não compreendessem o propósito do trabalho missionário.Encontrando uma casa apropriada, por uma questão de ética, deviam permanecer ali até terminarem a sua missão, e não ficar mudando de um lugar para outro, à procura de conforto. A paz dos apóstolos devia vir sobre aquela casa, mas não como uma saudação formal, porém como uma palavra de poder, do mesmo modo que Jesus a trouxe para os discípulos em João 20:19 (compare com a saudação formal registrada em I Samuel 25:6). Se a casa fosse digna, viria sobre ela a paz do Senhor. Se não fosse digna, os discípulos deveriam ficar em paz, e não transtornados. É fato que os mensageiros de Deus nem sempre são bem tratados. Mas isso não deve perturbá-los, nem desanimá-los. É necessário ter bom ânimo e seguir em frente.
V.14 – Se alguém não vos receber, nem ouvir as vossas palavras, ao sairdes
daquela casa ou daquela cidade, sacudi o pó dos vossos pés.
V.15 – Em verdade vos digo que menos rigor haverá para Sodoma e Gomorra,
no dia do juízo, do que para aquela cidade.
Com os que não os recebessem e não dessem ouvidos às suas palavras, não deviam perder tempo. Deviam sair daquela casa ou cidade e sacudir o pó dos pés. Este era um gesto de advertência que significa isenção de responsabilidade dos mensageiros, sobre o que viesse a acontecer com aquelas pessoas. O que acontecerá com os que recusam a Palavra de Cristo transmitida pelos seus enviados é o que Ele esclarece no V.14: Eles serão julgados com maior rigor do que Sodoma e Gomorra, porque não receberam nem os mensageiros e nem a Palavra de Cristo (11:23-24).
É importante observar que este comissionamento dos apóstolos, as restrições e as recomendações dada a eles são para aqueles dias do ministério de Jesus, até a Sua morte e ressurreição. Todavia há lições importantes a retirar para os pregadores e missionários de hoje, como a urgência da pregação; o desprendimento das cousas materiais, especialmente do dinheiro; a cautela no planejamento do trabalho e no preparo da mensagem.
Observações:
1 – Segundo alguns estudiosos do Novo Testamento, os versos de 5 a 15
constituem a primeira fase do comissionamento dos discípulos, que vai até
a morte de Jesus e a Sua ressurreição. As palavras: “Em verdade vos digo”
são o sinal de encerramento deste período.
2 – Os relatos de Marcos e Lucas sobre este primeiro comissionamento dos
apóstolos são muito sucintos e são paralelos a Mateus 10:5-14.