AS ADMOESTAÇÕES PARA OS DOZE
MATEUS 10:16-23
V.16 – Eis que eu vos envio como ovelhas para o meio de lobos; sede, portanto,
prudentes como as serpentes e símplices como as pombas.
V.17 – Acautelai-vos dos homens; porque vos entregarão aos tribunais e vos
açoitarão nas suas sinagogas;
V.18 – por minha causa sereis levados à presença de governadores e de reis,
para lhes servir de testemunho, a eles e aos gentios.
Quando Jesus começou a preparar os doze discípulos para enviá-los ao campo missionário, Ele lhes mostrou o cenário de uma multidão necessitada de cuidados, um povo abatido e abandonado pelos líderes da nação e sem nenhuma ajuda espiritual. Eram como ovelhas que não têm pastor (9:36). Agora os apóstolos é que são enviados como ovelhas para o meio de lobos, os mesmos que haviam desprezado aquele rebanho de que Jesus falou anteriormente. Portanto eles deviam usar de muita prudência como prudentes são as serpentes. Estes animais são perspicazes e estão sempre alerta para não se deixarem surpreender. É apenas neste aspecto que os discípulos deviam imitá-las (veja comentário de 7:6, no Sermão da Montanha). Em outros casos as serpentes são apontadas na Bíblia como símbolo do engano (Genesis 3:1-5). A simplicidade das pombas é figura da sinceridade, isto é, da pureza de intenções, quando não há duplicidade de propósito, o que caracteriza a firmeza do cristão (5:37). Ao que parece, a metáfora das serpentes e das pombas era um provérbio conhecido entre os judeus. Usando estes princípios os discípulos podiam mostrar a veracidade das suas intenções e podiam evitar situações embaraçosas com os ouvintes. Sabedoria e simplicidade são ensinadas por Jesus em 5:38-42. Os lobos, como se pode comprovar no futuro, são as autoridades civis e religiosas de Israel.
Os tribunais eram Sinédrios locais constituídos por vinte e três membros que, na Palestina, funcionavam separados das sinagogas. Mas na diáspora, ou seja, nas colônias de judeus fora dos limites de Israel, eles funcionavam em conjunto com elas. Desde que não havia separação entre o governo civil e o religioso, os condenados podiam ser levados a julgamento nas próprias sinagogas, onde também eram açoitados. Quando o V.17 fala das “suas sinagogas”, está querendo dizer que Jesus e Seus discípulos já se haviam apartado das sinagogas dos judeus.
Os governadores referidos no V.18 são procuradores romanos como Pilatos e os governadores Félix e Festo que, mais tarde, interrogaram o apóstolo Paulo em Cesaréia (Atos 24,25). Os reis envolvidos com os apóstolos são Herodes Agripa I (Atos 12:1-8), que mandou matar Tiago, irmão de João e Herodes Agripa II, que ouviu o testemunho de Paulo em Cesaréia e disse que quase se tornou cristão (Atos 25,26). A referência aos gentios no V.18 é uma antecipação que Jesus fez do trabalho missionário da igreja entre eles no futuro.
V.19 – E, quando vos entregarem, não cuideis em como, ou o que haveis de
falar, porque naquela hora vos será concedido o que haveis de dizer;
V.20 – visto que não sois vós os que falais, mas o Espírito do vosso Pai é quem
fala em vós.
Quando Jesus falou aos discípulos sobre a ação do Espírito Santo, eles ainda não tinham experiência do assunto, porque o Espírito ainda não havia descido sobre eles. Isto só aconteceu após a ressurreição (João 20:21-23) e, especialmente, em Pentecoste (Atos 1:8; 2:1-4). Por enquanto eles tinham recebido autoridade de Jesus para o ministério da pregação, para efetuarem curas, ressurreição de mortos e expulsão de demônios. Enquanto isso, de acordo com João 14:17 o Espírito permanecia ao “lado deles”, isto é, em Jesus e, no futuro, estaria “dentro deles”. Isto é comprovado pelo desempenho de Pedro em Pentecoste (Atos 2:14-41) e pelo reconhecimento dos judeus sobre a intrepidez de Pedro e João diante do Sinédrio (Atos 4:8,13).
V.21 – Um irmão entregará à morte outro irmão, e o pai ao filho; filhos haverá
Que se levantarão contra os progenitores e os matarão.
V.22 – Sereis odiados de todos por causa do meu nome; aquele, porém, que
perseverar até o fim, esse será salvo.
V.23 – Quando, porém, vos perseguirem numa cidade, fugi para outra; porque
em verdade vos digo que não acabareis de percorrer todas as cidades de
Israel, até que venha o Filho do homem.
A respeito dos laços afetivos e sentimentais que unem as pessoas de uma família, sabemos que são tão fortes, que seria difícil crer nesta profecia, se ela não tivesse sido cumprida. Isto, porque o ódio que nasce por motivos religiosos superam em muito a força que une irmãos com irmãs e pais com filhos. Como diz o profeta: “Enganoso é o coração mais do que todas as cousas, e desesperadamente corrupto, quem o conhecera?” (Jeremias 17:9). Os judeus já tinham consciência disso, pois foram advertidos a esse respeito pelo profeta Miquéias (7:5-6). Jesus está aplicando esta palavra a uma incrível situação de oposição a Deus e ao Seu Evangelho, que induz homens incrédulos a quebrarem os laços afetivos mais sagrados entre parentes e amigos, que é o amor. Por isso, muitos crentes foram levados à perseguição e a tormentos os mais horríveis que a mente humana pode imaginar. A história comprova que, por causa do nome de Jesus, muitos foram crucificados, colocados em óleo fervente, queimados em estacas, assados lentamente sobre brasas incandescentes, expostos a animais carnívoros; obrigados a beber chumbo derretido, untados com piche e queimados para iluminar os jardins do palácio de Nero. Por mais espantoso que possa parecer, pais, filhos, irmãos, maridos e mulheres tornaram-se tão perversos contra os que se tornaram cristãos, que entregaram seus entes queridos a esse tipo de martírio.
O V.22 esclarece que os enviados de Cristo serão odiados de todos (os homens maus), porque estes odeiam a Cristo. Mas os que suportarem essas provações sem negar a fé serão salvos (10:32-33).
A perseguição aos apóstolos prevista por Jesus e a precaução de fugirem de uma cidade para outra devia acontecer antes da vinda do Filho do homem. Esta vinda não significa a segunda vinda para o juízo final, mas uma vinda para julgamento da nação de Israel. Tudo começou como está escrito em Mateus 24:15; Marcos 13:14; e Lucas 21:20). Os exércitos romanos sitiaram Jerusalém, invadiram o templo e mataram uma grande quantidade de judeus que lá se refugiaram. Esta profanação do templo é o que se chama de “o abominável da desolação de que falou o profeta Daniel” (Mateus 24:15; Lucas 21:20).
Aqui se encerra mais uma etapa do ministério dos apóstolos, sinalizado pela expressão “em verdade vos digo”. O livro de Atos mostra quanto os apóstolos foram perseguidos pelos judeus governantes em Jerusalém e quanto o apóstolo Paulo foi perseguido, preso e ameaçado mesmo entre os gentios, todas essas cousas, entre a crucificação e a destruição de Jerusalém, no ano 70 D.C.