APARIÇÕES DE JESUS NO EVANGELHO DE JOÃO
JOÃO 20:24 - 21:23
V.24 - Ora, Tomé, um dos doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando
veio Jesus.
V.25 - Disseram-lhe, então, os outros discípulos: Vimos o Senhor. Mas ele
o dedo, e não puser a mão no seu lado, de modo algum acreditarei.
Além da aparição a Maria Madalena (20:11-18 cf. Marcos 16:9-11), as parições de Jesus aos apóstolos destacam-se, no Evangelho de João, por sua excepcional importância. A primeira, tem lugar ao cair da tarde do dia da ressurreição, o primeiro dia da semana, quando os onze estavam reunidos (20:19-23 cf. Lucas 24:36-43), com outros que não são mencionados, trancados em uma casa com medo dos judeus e, de repente, Jesus manifestou-se no meio deles dizendo: “Paz seja convosco”. Paz era o de que eles precisavam pois, na passagem paralela de Lucas, eles são descritos como surpresos, atemorizados, perturbados, com duvidas nos corações, acreditando estar vendo um espírito (fantasma). Mas Jesus lhes trouxe a paz e eles se alegraram.
É digna de nota a pergunta de Jesus em Lucas 24:38b: “...por que sobem duvidas em vossos corações?” Neste episódio descrito por Lucas, a dúvida dos discípulos era quanto a pensarem estar vendo um espírito. Por isso Jesus se submeteu a um exame do Seu corpo físico-material, mostrando-lhes as mãos e os pés, e deixando-os apalparem-nO para verificarem que Ele era carne e osso mesmo. Além disso, Ele comeu na presença deles, para comprovar ainda mais a Sua presença real naquele lugar. Seu corpo de gloria não está sujeito a limitações de quaisquer espécies. Ele pode manifestar-se em qualquer lugar e qualquer tempo, da maneira como Ele quer, para atender às necessidades dos seus discípulos, no cumprimento do propósito da salvação (cf. Atos 9:3-6 ; I coríntios 15:8). A inclusão da narrativa de João que Jesus provou aos discípulos que Ele tinha carne e osso era importante para combater a doutrina “docetista”, ligada ao gnosticismo da época, de que Jesus não veio em carne a este mundo, mas veio como um espírito em forma de corpo humano (I João 4:1-3).
Lucas não faz menção a Tomé, porque ele não estava presente naquela reunião dos onze e de outros (Lucas 24:33). Mas João informa que, ao ouvir a notícia de que o Senhor ressuscitado manifestou-se a eles em forma visível, ele afirmou que, de modo nenhum creria, se não visse os sinais dos cravos nas suas mãos, e não os tocasse com o dedo, bem como se não pusesse a mão no seu lado.
V.26 - Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos, e
Tomé, com eles. Estando as portas trancadas, veio Jesus, pôs-se no meio
e disse-lhes: Paz seja convosco!
V.27 - E logo disse a Tomé: Põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; chega também
a mão e põe-na no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente.
V.28 - Respondeu-lhe Tomé: Senhor meu e Deus meu!
V.29 - Disse-lhe Jesus: Porque me viste, creste? Bem-aventurados os que não
viram e creram.
Oito dias depois Jesus voltou a manifestar-se aos discípulos reunidos nas mesmas condições, agora com a presença de Tomé. Jesus deu-lhe a oportunidade de dirimir as suas dúvidas, convidando-o a ver as Suas mãos, tocar os sinais dos cravos e apalpar o seu lado. Tomé, um discípulo sistemático, demonstrou por suas atitudes, ser corajoso, mas pessimista. Corajoso, porque estava disposto a morrer com Jesus (11:16), enquanto os outros não estavam (11:7-8). Pessimista, porque pensava que tudo deu errado, e preferia curtir a sua decepção longe dos discípulos (V.24), embora ele amasse Jesus. Mas ele era franco e sincero, porque não hesitou em expor as suas dúvidas diante dos demais apóstolos; era rigoroso em seus conceitos, porque procurava a verdade dos fatos; era exigente, porque não aceitava noticia sem confirmação; mas era honesto, porque não recusou aceitar as provas oferecidas por Jesus, e reconheceu-O como vivo, ressuscitado e glorificado, ao dizer: “Senhor meu e Deus meu”. Em outras palavras ele reconheceu a Sua divindade e o Seu “status” no céu como Senhor (cf. Filipenses 2:9-11). Jesus confirmou a sua fé dizendo: “Por que me viste creste?”, pergunta que deve ser interpretada positivamente. Ele creu porque viu. Então Jesus declarou bem-aventurados os que não viram e creram. Esta bem-aventurança alcança até o ultimo pecador que for salvo pela fé em Jesus.
Na primeira vez que Jesus se manifestou aos discípulos, Ele os designou para serem continuadores do Seu ministério apostólico no mundo, dizendo: “Assim como o pai me enviou, eu também vos envio” (20:21b; cf 17:18). Em seguida, soprou sobre eles e acrescentou: “Recebei o Espirito Santo. Se de alguns perdoardes os pecados, são-lhes perdoados; se lhos retiverdes, serão retidos”. Jesus também recebeu o Espirito Santo antes de ser consagrado para o Seu ministério (Lucas 3:21-22; 4:14-15; cf Joao 1:32-34). Quanto ao poder de perdoar e reter pecados, não se refere a poder concedido aos apóstolos como homens, mas refere-se ao poder de Deus, contido no Evangelho, que eles estavam sendo comissionados para pregar e, nesse ministério o Espirito Santo os guiaria a toda verdade (16:13), o mesmo espirito que convence o mundo do pecado, da justiça e do juízo (16:8). Neste esquema organizado por Deus, estes apóstolos que representam o próprio Cristo vivo neste mundo, estão recebendo a chave do reino, para abrir ou fechar as suas portas aqui na Terra, conforme os preceitos estabelecidos por Deus no Céu (Mateus 28:18-20; Marcos 16:15-16; Lucas 24:47-49). Isto tem tudo a ver com as palavras de Cristo a Pedro e aos demais apóstolos nas passagens citadas. Paulo dá um excelente testemunho da interação de Cristo com o poder do Espirito Santo e o Seu ministério de levar gentios à obediência ao evangelho (Romanos 15:18-21; cf. Romanos 1:5). É muito importante que a igreja esteja consciente de que, a partir de pentecoste, este mandato e esta responsabilidade estão sobre seus ombros.
V.30 - Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro.
V.31 - Estes, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome.
Estes dois versículos têm aparecia de ser o encerramento deste Evangelho. Se este for o caso, o capitulo 21 foi acrescentado mais tarde, quando já era divulgada a história até o capitulo 20, que tinha dois objetivos: Primeiro, que os leitores viessem a crer que Jesus é o Cristo, o filho de Deus. Pois o material selecionado pelo apostolo em termos de milagres, sinais, ensinos e pregação é suficiente para convencê-los dessa grande verdade. Acrescente-se, ainda, o que Jesus fez na presença dos discípulos, que não está registrado neste Evangelho e, nem mesmo nos outros. Segundo, que, com essa convicção, era-lhes garantida a vida em Seu nome, isto é, a vida eterna (cf. 5:24).
CAPITULO 21
V.1 - Depois disto, tornou Jesus a manifestar-se aos discípulos junto do mar de
Tiberíades; e foi assim que ele se manifestou:
V.2 - estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael, que era
de Caná da Galiléia, os filhos de Zebedeu e mais dois dos seus discípulos.
V.3 - Disse-lhes Simão Pedro: Vou pescar. Disseram-lhe os outros: Também nós
vamos contigo. Saíram, e entraram no barco, e, naquela noite, nada
apanharam.
V.4 - Mas, ao clarear da madrugada, estava Jesus na praia; todavia, os discípulos
não reconheceram que era ele.
V.5 - Perguntou-lhes Jesus: Filhos, tendes aí alguma coisa de comer?
Responderam-lhe: Não.
V.6 - Então, lhes disse: Lançai a rede à direita do barco e achareis. Assim
fizeram e já não podiam puxar a rede, tão grande era a quantidade de
peixes.
V.7 - Aquele discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: É o Senhor! Simão
Pedro, ouvindo que era o Senhor, cingiu-se com sua veste, porque se havia
despido, e lançou-se ao mar;
V.8 - mas os outros discípulos vieram no barquinho puxando a rede com os
peixes; porque não estavam distantes da terra senão quase duzentos
côvados.
A intenção com que este capitulo foi acrescentado ao final deste Evangelho, que parecia terminar em 20:32 é corrigir um erro de interpretação do que Jesus falou em 21:22, segundo a qual o apostolo João não morreria até Jesus voltar. Esta falsa notícia ainda persistia na igreja, quando João escreveu este Evangelho (85-90 D.C.). O mal-entendido é desfeito no V.23. Mas há outras coisas importantes que Jesus deixa claro nesta terceira manifestação a eles. Por isso, este capítulo constitui-se num apêndice muito apropriado para este Evangelho. A cena descrita aqui é de uma beleza impressionante pelo mistério que a envolve e pela admiração que produz.
O acontecimento deu-se no Mar de Tiberíades, que é o mesmo Mar da Galiléia, onde Jesus encontrou os primeiro discípulos e os chamou para serem pescadores de homens (Mateus 4:18-22; Marcos 1:16-20; Lucas 5:10-11). Agora estavam ali de novo, porque Jesus, depois de ressuscitado, ordenou que eles fossem para a Galiléia, onde os encontraria (Mateus 28:7; Marcos 16:7). Dos cinco discípulos mencionados no V.2, quatro eram da Galiléia (Pedro, Tiago e João filhos de Zebedeu, e Natanael). De Tomé, não se conhece a origem, mas os dois não citados por nome, bem podiam ser André e Filipe.
Nesta manifestação que João diz que “foi assim” Jesus não se apresentou aos discípulos de modo diferente de quando Ele estava encarnado. Apesar de que eles não o reconhecerem imediatamente, Ele se comportou como uma pessoa normal, falando com eles e, até orientando-os na pesca, como costumavam fazer aqueles personagens do Mar da Galiléia, que orientavam os pescadores na pesca noturna para lançarem a rede para um lado ou para o outro do barco, conforme eles viam aproximarem-se do barco os cardumes, que os pescadores de dentro do barco não podiam ver.
A pergunta de Jesus no V.5 pode ser parafraseada do seguinte modo: “Rapazes, vocês não tem nada para comer?” e eles responderam: “nada, nada”. Então Jesus mandou-os lançarem a rede à direita do barco. O milagre foi semelhante ao do início do ministério em Lucas 5:1-11, quando Jesus os remeteu ao mar para lançarem as redes. Naquela ocasião, ao ver o milagre, Pedro disse cheio de temor: “Senhor, retira-te de mim, porque sou pecador”. Agora, porém, ele aproxima-se do Mestre, sem receio, porque já conhecia o Seu perdão, através da Sua morte e ressurreição (cf. I Pedro 1:3).
Foi aí que o discípulo amado O reconheceu e avisou a Pedro. É explicável que o primeiro discípulo a reconhecer Jesus, foi aquele que, vendo o tumulo vazio e lençóis deixados lá, teve sensibilidade e inteligência para concluir que Ele ressuscitara. Então viu e creu (20:3-8). Pedro, que havia despido a veste superior, apressou-se a vesti-la novamente, porque queria saudar Jesus com reverência, aliás, como exigia a ética dos judeus. Por isso, ele pulou no mar, enquanto os outros discípulos vieram no barquinho arrastando a rede cheia de peixes, num percurso de aproximadamente cem metros.
V.9 - Ao saltarem em terra, viram ali umas brasas e, em cima, peixes; e havia
também pão.
V.10 - Disse-lhes Jesus: Trazei alguns dos peixes que acabastes de apanhar.
V.11 - Simão Pedro entrou no barco e arrastou a rede para a terra, cheia de
cento e cinquenta e três grandes peixes; e, não obstante serem tantos, a
rede não se rompeu.
V.12 - Disse-lhes Jesus: Vinde, comei. Nenhum dos discípulos ousava perguntar-
lhe: Quem és tu? Porque sabiam que era o Senhor.
V.13 - Veio Jesus, tomou o pão, e lhes deu, e, de igual modo, o peixe.
V.14 - E já era esta a terceira vez que Jesus se manifestava aos discípulos,
depois de ressuscitado dentre os mortos.
O Evangelho de João descreve muitas realidades espirituais por meio das palavras de Jesus. Por exemplo, em 7:37-38 as palavras de Jesus ilustradas por meio da “água”, são interpretadas pelo apostolo, no V.38, como se referindo ao Espirito Santo. Assim, o fato da rede vir para a terra cheia de 153 grandes peixes indica o resultado do trabalho dos apóstolos, e o trabalho missionário da igreja, de trazer pecadores para o reino de Deus (Mateus 4:19; Marcos 1:17; Lucas 5:10).
A respeito do número 153, há muitas hipóteses que tentam explica-lo. Gerônimo afirmava que este é o número de espécies de peixes existentes em todo o mundo. Portanto eles representam cidadãos de todas as nações, tribos, povos e línguas, que entram para o reino de Deus (cf. Lucas 14:21-23; Apocalipse 7:9-10). Mesmo que o número 153 não represente a quantidade de espécies de peixes no mundo, a conclusão do raciocínio é logica, porque no reino de Deus há cidadãos de todos os povos da terra. Há outras explicações que procuram associar a lógica matemática ao significado simbólico do número, mas são meros exercícios mentais, sem base racional.
Quanto a Pedro ter arrastado a rede cheia de peixes para a praia (V.11) pode indicar a sua preeminência no grupo apostólico, assim como foi ele que abriu as portas do reino, no dia de Pentecoste (cf. Atos 2:14-41).
É digna de nota a observação do apostolo João no V.12, que nenhum dos discípulos teve coragem de perguntar quem era aquela pessoa, na presença da qual estavam comendo. Nem mesmo este discípulo que se reclinara sobre Seu peito (13:25). Mas ele explica: “porque sabiam que era o senhor”. Isto mostra uma atitude de reverente temor diante do Senhor Ressuscitado, que agora tinha uma bagagem de gloria maior do que aquela que Ele tinha, quando andava com eles na Terra.
O V.14 está na posição de uma afirmação de que, após esta terceira aparição, não era mais necessário que Jesus se manifestasse aos discípulos. Ele havia dado provas cabais da sua ressurreição e eles creram. Essas provas não podem deixar dúvida da Sua realidade, e destroem qualquer ideia de que as suas aparições eram produto da mente humana ou de alucinação. Como diz W. C. Taylor: “E, mais que tudo, a ressurreição provou que a redenção deles, cujo preço Ele pagou no Calvário, é de valor real para todos os que confiam no nome do salvador, ou em outras palavras, que a salvação alcançada mediante a fé em Jesus Cristo é salvação genuína”.