sábado, 10 de janeiro de 2015

A QUESTÃO DO TRIBUTO

                                                       A QUESTÃO DO TRIBUTO
                     MARCOS 12:13-17     (Mateus 22:15-22; Lucas 20:19-26)

V.13 - E enviaram-lhe alguns dos fariseus e dos herodianos,
          para que o apanhassem em alguma palavra.
V.14 - Chegando, disseram-lhe: Mestre, sabemos que és verdadeiro
          e não te importas com quem quer que seja, porque não olhas
          a aparência dos homens, antes segundo a verdade
          ensinas o caminho de Deus; é lícito pagar tributo a César, ou não?
          Devemos ou não devemos pagar?
V.15 - Mas Jesus, percebendo-lhes a hipocrisia, respondeu:
          Por que me experimentais? Trazei-me um denário para que eu o veja.
V.16 - E eles lho trouxeram. Perguntou-lhes:
          De quem é esta efígie e inscrição? Responderam: De César
V.17 - Disse-lhes então Jesus: Dai a César o que é de César,
          e a Deus o que é de Deus. E muito se admiraram.

Depois do confronto de Jesus com aqueles adversários na questão do batismo de João e na parábola dos lavradores maus, eles se retiraram frustrados. Agora preparam um plano para o apanhar o Mestre de maneira sutil, e esta é a primeira tentativa neste sentido. Alguns fariseus e muito provavelmente também alguns herodianos faziam parte do Sinédrio, que era o supremo tribunal dos judeus. Tudo indica que estes enviados a Jesus eram representantes daquela corte. Mateus informa que estes enviados eram discípulos dos fariseus, e foram juntos com os herodianos. Lucas informa que os principais sacerdotes estavam envolvidos no caso, e que os emissários eram subornados (Mateus 22:15-16; Lucas 20:19-20). Eram adversários políticos por tradição, mas agora se aliaram para fazer oposição a Jesus. Eles pretendiam apanhá-lo em alguma palavra, o que significa descobrir nele alguma contradição com o pensamento geral do povo ou qualquer afirmação contra o sistema de governo estabelecido pelos romanos. Para isto o experimentaram com uma pergunta. Mas antes de expor a questão, procuraram cercá-lo com palavras que o comprometessem a não se desviar da resposta que desejavam receber. Então disseram que ele era verdadeiro, isto é, que ele não daria uma resposta enganosa. Disseram que ele não se importava com quem quer que fosse, isto é, ele não tinha receio de como outros pudessem reagir em função da sua resposta, visto que ele não estava preocupado com a aparência ou com a posição dos homens, e sim, em ensinar o caminho de Deus, segundo a verdade. Foi nestas condições que lançaram a pergunta programada para que ele respondesse com “sim” ou “não”: “é lícito pagar tributo a César, ou não? Devemos ou não devemos pagar?” Ali estava a multidão para testemunhar o que ele respondesse, tal como no momento em que lhe perguntaram com que autoridade expulsou os cambistas e mercadores do Templo, virando suas mesas e derrubando as cadeiras. Se Jesus respondesse: sim, é lícito pagar tributo a César, ele seria considerado um covarde, temeroso do poder dos romanos, e um traidor da pátria. Com isto ele perderia o prestígio que tinha diante do povo, porque todos consideravam ilícito em relação aos princípios de Deus, pagar tributo a um monarca estrangeiro e gentio.
 O imperador romano da época era Tibério César, visto pelos judeus como homem injusto e opressor do povo de Deus. Desde a morte de Herodes, o Grande, no ano 4 da nossa era, a região sul da Palestina, que incluía a Judéia, teve sérios problemas com a administração do Império. A partir do ano 6 foi necessária a intervenção romana nomeando procuradores para governar, e enviando tropas para manter a ordem no país. Por ser considerada foco de agitação, a Judéia perdeu a sua independência, passando a ser província romana. Com isto os impostos passaram a ser recolhidos diretamente aos cofres do Império. Houve um certo Judas gaulonita, que se levantou contra essa medida e incitou a população a rebelar-se contra os dominadores e a usar até de violência em nome de Deus. Apesar de que tomaram providências contra ele, a sua proposta de não pagar tributo aos romanos tornou-se o lema sagrado dos judeus patriotas mais fanáticos os quais estavam sempre na mira dos romanos. Diante de tudo isto, se Jesus dissesse: “não! não se deve pagar tributo a César”, então ele seria denunciado diante das autoridades do Império, e preso como revolucionário. Seus adversários imaginavam que ele não poderia sair do dilema em que o colocaram e assim, daria a resposta que eles esperavam.
Apesar de ter percebido a hipocrisia dos inquiridores, Jesus não tentou escapar do cerco, nem desviar-se da resposta que exigiam e que ele mesmo queria dar. Antes, procurou atrair a atenção de todos para o ensino importante que ia trazer naquela oportunidade. Para isso, pediu que lhe trouxessem uma moeda de 1 denário. Estas moedas tinham inscritas de um lado as seguintes palavras: “Tibério César Augusto, Filho do Divino Augusto”. Do outro lado estava a imagem do imperador, onde também se lia a inscrição: “Sumo Sacerdote”. Então Jesus disse: “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Ele estava falando do direito que o governo tem de cobrar impostos para manter a ordem econômica, social e política do país. Isto tem um preço, e todo cidadão tem um débito para com o governo que está cuidando dessa ordem. Com isto Jesus esclarece que pagar imposto ao governo não está em desacordo com a lei de Deus, ainda que seja um governo estrangeiro e gentio, como era o dos romanos sobre os judeus.
É necessário compreender que os governos são instituições humanas autorizadas por Deus. Jesus disse a Pilatos: “Nenhuma autoridade terias sobre mim, se de cima não te fosse dada...” (João 19:11). Os governos cuidam dos serviços públicos, dos quais cada cidadão em particular não pode cuidar. Como exemplo temos os serviços de água, luz, telefone, transporte, segurança social, saúde etc. Tudo isso facilita a vida do povo, e Deus requer dos governos que os executem porque um dia haverão de prestar contas deles. Mas para receber tais benefícios e para que eles sejam mantidos é necessário cada um arcar com a parcela de responsabilidade que lhe cabe. Isto se faz mediante o pagamento de impostos, taxas e tarifas.
Foram os romanos que trouxeram para o mundo antigo o sentido de segurança que antes não era conhecido. Eles acabaram com a pirataria nos mares e com os salteadores na maioria das rotas terrestres, exterminaram as guerras civis estabelecendo a paz nos países dominados, substituíram os tiranos desvairados e caprichosos pela justiça romana, e assim por diante. O grande mérito do Império Romano foi trazer a paz social a um mundo em ebulição. A Ásia menor e o Oriente conheceram um período de tranquilidade que antes nunca haviam experimentado e, provavelmente, nem depois. Enfim, o mundo do primeiro século veio a conhecer a “Paz Romana” quando as províncias podiam dirigir despreocupadamente os seus próprios negócios, os cidadãos podiam cuidar das suas famílias, os correios funcionavam regularmente, as viagens podiam ser feitas sem perigo, tudo por causa do sentido de organização do Império. Jesus não desconhecia estas cousas. Por isso ele trouxe ensinos simples mas verdadeiros a esse respeito, no tempo oportuno. Os apóstolos Pedro e Paulo também escreveram sobre a responsabilidade do cristão com relação ao Estado (cf. 1Pedro 2:13-14 e Romanos 13:1-7). Mas o ensino de Jesus vai além da relação entre o cidadão e o governo. Por isso ele diz: “Dai a Deus o que é de Deus”. Ele mostrou que, olhando para a imagem de César estampada na moeda de 1 denário, todos deviam reconhecer a necessidade de lhe render tributo. Mas olhando para a imagem de Deus gravada em Cristo, é necessário compreender que temos para com ele uma dívida irresgatável e por isso devemos render-lhe tributo de honra e glória, através de uma vida de obediência, de adoração, de louvor e ações de graça eternamente. Isto é o que deviam ter feito fariseus, herodianos, sacerdotes e sumo-sacerdotes (cf João 14:9).
Jesus é a imagem do Deus invisível, e n’Ele habita a plenitude da divindade (Colossenses 1:15a; 2:9).
OBS: Marcos e Lucas colocam este episódio logo em seguida à parábola dos lavradores maus. Mateus intercala a parábola das bodas entre aquela dos lavradores maus e a questão do tributo. A razão é que Mateus desenvolveu a crise do desrespeito a autoridade divina até o ponto mais alto, que é a parábola das bodas.