sábado, 10 de janeiro de 2015

A FIGUEIRA SEM FRUTO, A PURIFICAÇÃO DO TEMPLO E O PODER DA FÉ

          A FIGUEIRA SEM FRUTO, A PURIFICAÇÃO DO TEMPLO E O PODER DA FÉ
                       MARCOS 11:12-26        (Mateus 21:12-13, 18-22; Lucas 19:45-46)

V.12 - No dia seguinte, quando saíram de Betânia, teve fome.
V.13 - E, vendo de longe uma figueira com folhas, foi ver se nela,
          porventura, acharia alguma cousa. Aproximando-se dela
          nada achou, senão folhas; porque não era tempo de figos.
V.14 - Então lhe disse Jesus: Nunca jamais coma alguém
          fruto de ti. E seus discípulos ouviram isto.
V.15 - E foram para Jerusalém. Entrando ele no templo passou a expulsar
          os que ali vendiam e compravam; derrubou as mesas dos cambistas
          e as cadeiras dos que vendiam pombas.
V.16 - Não permitia que alguém conduzisse qualquer utensílio pelo templo;
V.17 - também os ensinava e dizia: Não está escrito:
          A minha casa será chamada casa de oração, para todas as nações?
          Vós, porém, a tendes transformado em covil de salteadores.
V.18 - E os principais sacerdotes e escribas ouviam estas cousas
          e procuravam um modo de lhe tirar a vida; pois o temiam,
          porque toda a multidão se maravilhava de sua doutrina.
V.19 - Em vindo a tarde, saíram da cidade.
V.20 - E, passando eles pela manhã, viram que a figueira secara desde a raiz.
V.21 - Então Pedro, lembrando-se, falou: Mestre,
          eis que a figueira que amaldiçoaste, secou.
V.22 - Ao que Jesus lhes disse: Tende fé em Deus;

Jerusalém estava repleta de gente por causa das festividades da Páscoa que se aproximava. Ali estavam também muitos inimigos de Jesus. Apesar de que as cidades da periferia ficavam cheias de peregrinos, Ele podia descansar sem ser observado pelos adversários em Betânia onde Ele tinha muitos amigos e onde ficava a casa de Marta, Maria e Lázaro, que Ele tinha ressuscitado havia poucas semanas. Por isso, no domingo, sendo já tarde, Ele saiu para Betânia com os doze.
Para acompanhar cronologicamente os acontecimentos da última semana do ministério de Jesus, vamos por em ordem alguns fatos:
1 - No domingo, que é tradicionalmente chamado “Domingo de Ramos” ele entrou de dia em Jerusalém, foi até o Templo, e observou tudo. À noite ele estava em Betânia.
2 - Na segunda feira, de caminho para Jerusalém, ele amaldiçoou a figueira e passou o dia no templo, quando expulsou de lá os comerciantes e os cambistas. À tarde, saiu da cidade.
3 - Na terça feira de manhã, indo de novo para Jerusalém, os discípulos viram que a figueira secara. Neste dia Jesus dá abundantes e preciosos ensinos registrados por Marcos até o final do capítulo 13.
O que aconteceu com esta figueira é mais um ensino de Jesus, dado por meio de uma “parábola em ação”. O caso está relacionado com o que se passou no dia em que Ele entrou no templo e observou tudo. Mas o que foi que Ele observou? Tudo o que tinha direito de observar! Ele é a suprema autoridade, destinado e acreditado por Deus para julgar o mundo com justiça no Dia Final. O que Ele viu, certamente O entristeceu, porque Ele não veio para destruir, e sim, para salvar. Por enquanto Ele é advogado de defesa, mas naquele dia será juiz. Ele observou tudo com o coração cheio de compaixão e com os olhos cheios de lágrima, pois ele chorou à vista da cidade, ao entrar em Jerusalém (cf. Lucas 19:41). Ele viu o Templo transformado em covil de salteadores. Não era esta a finalidade com que Deus fez levantar no meio do povo de Israel o Seu tabernáculo, o lugar da Sua habitação. Disfarçados de virtuosos, as autoridades religiosas fizeram dali o refúgio de homens viciados em atividades abomináveis. Os recintos sagrados eram ocupados por cambistas de baixa moral. O pátio dos gentios estava profanado pela presença de animais vendidos para o sacrifício. Eles agiam sob o pretexto de facilitar o culto: cambistas trocavam a moeda dos peregrinos para o pagamento do imposto anual do Templo pela moeda específica para esse fim, mas cobravam uma sobretaxa abusiva. Os vendedores de animais para o sacrifício, vendiam-nos por preços muito acima do normal. E tudo era feito em nome da devoção a Deus.
Mas Jesus observou também a oposição dos líderes religiosos contra o propósito de Deus, visto que rejeitavam o Filho enviado do céu, porquanto temiam a sua interferência nos negócios da nação. Finalmente Jesus observou que o povo criado por Deus para cumprir o seu propósito de redenção para todas as nações havia perdido a fé. Por isso, quando falou aos discípulos: “Tende fé em Deus”, ele estava propondo-lhes viver uma vida de qualidade produzida pela fé, de tal modo que não viessem a secar como aquela figueira que representava o estado da nação sem fé. Pois a figueira, tanto quanto a videira, era um símbolo nacional. E Jesus procurou fruto nela e não encontrou.
Israel era como uma árvore plantada por Deus que lhe deu a dádiva da vida, e a sustentava para que produzisse fruto. O Salmo 80 é uma súplica de Asafe a Deus, em nome do povo, no sentido da restauração da videira que ele plantou e depois destruiu, porque não produzia nada. Agora também, Jesus procurou fruto nela e não encontrou. No capítulo 5 de Isaías há uma parábola da qual consta o doloroso anúncio do Senhor que iria destruir a vinha em que plantou a videira porque, em vez de uvas boas, produziu uvas bravas. Israel não correspondeu ao propósito de Deus: Ele esperava justiça, mas via opressão; esperava retidão, mas via corrupção; e este não era o tributo que a nação Lhe devia, porque ele a criou e mantinha a vida nacional, como quem cuida de uma árvore, para produzir bom fruto. Por isso, nesta parábola da vinha, ele antecipa ao povo qual será o seu futuro: sua cerca e seu muro serão retirados, Deus cessará a proteção que dava à nação, para que ela seja invadida e pisoteada pelos inimigos, do mesmo modo que acontece quando o gado invade uma plantação, e come, e pisoteia tudo o que ali cresceu.
Todos estes exemplos do passado estão presentes na parábola da figueira que secou imediatamente, quando Jesus a censurou. Este efeito dramático é mais um ingrediente próprio da didática do Mestre que ninguém é capaz de reproduzir, e que impressiona fortemente os leitores e os ouvintes até o dia de hoje.
Israel não se ajustava ao propósito de Deus e nele não havia vestígio de arrependimento. Veio o precursor do Messias, mas não foi ouvido. Antes, o mataram. Agora, vem o próprio Messias com o seu reino, e também é rejeitado, sem ao menos ser reconhecido pela nação. Portanto, diante da justiça de Deus, Israel não poderia prevalecer, mas deveria sucumbir. No outro dia os discípulos verificaram que a figueira havia secado desde a raiz. Assim se completou o ensino profético que Jesus trouxe através desta “parábola em ação”. Mas o ponto a que ele queria chegar está expresso nesta exortação: “Tende fé em Deus”. Em resumo, para prevalecer diante da justiça de Deus e não ser destruído, é necessário produzir fruto; e para produzir fruto é necessário ter fé n’Ele.

V.23 - porque em verdade vos afirmo que se alguém disser a este monte:
          ergue-te e lança-te no mar, e não duvidar no seu coração,
          mas crer que se fará o que diz, assim será com ele.
V.24 - Por isso vos digo que tudo quanto em oração pedirdes,
          crede que recebestes, e será assim convosco.
V.25 - E, quando estiverdes orando, se tendes alguma cousa contra
          alguém, perdoai, para que vosso Pai celeste vos perdoe as vossas
          ofensas.
V.26 - [Mas, se não perdoardes, também vosso Pai celeste
          não vos perdoará as vossas ofensas].

Os discípulos precisavam compreender que deviam ter fé, não somente para evitar que fossem destruídos, mas também para remover os obstáculos destinados a impedir a implantação do reino de Deus entre os homens. Estes obstáculos são representados aqui pelo monte que deve ser lançado ao mar. Os doze eram formados segundo a mentalidade geral da nação e Jesus estava trabalhando com eles para resgatá-los daquelas tradições que os prendiam pelas raízes. Se eles não quisessem ser destruídos, precisavam ter fé em Deus, para que a sua vida espiritual não se extinguisse, e eles não se tornassem infrutíferos.
Mas agora o ensino passa para a parte prática e importante, de como isto acontece. É pela oração. Perante Deus a fé é expressa pela oração. Diante dos homens, a fé é comprovada por uma vida de compaixão, incluindo o perdão que se deve demonstrar. Isto é reconhecimento da dependência de Deus em que todos devem viver, buscando o perdão dele também. A oração aceitável a Deus é aquela isenta de ressentimento contra o próximo, porque foi antecipada pelo perdão. É a oração purificada pelo amor.
Em resumo, para levar em frente a missão de implantar o reino de Deus entre os homens, os discípulos precisam de fé, de vida frutífera com amor, compaixão, perdão e muita oração. Sem isto, o fim será o mesmo da figueira que secou desde a raiz.
O episódio da purificação do Templo está intercalado no caso da figueira e suas implicações. Por isso nós o deixamos de lado para analisá-lo à parte, o que faremos agora, lembrando que estes fatos correspondem aos versos 14 até 19.
O Templo de Jerusalém, na época de Jesus, era o que havia sido restaurado pelo rei Herodes, o Grande. A sua construção era sólida e a sua beleza era simplesmente extraordinária. Além da parte central aonde a entrada só era permitida aos sacerdotes, havia os pátios externos, onde podiam permanecer os homens de Israel, as mulheres e os gentios, cada um no seu respectivo átrio. O Pátio dos Gentios era, de todos, o mais exterior. Nele podiam entrar tanto os judeus como os gentios. Mas os gentios estavam proibidos de ingressar nos pátios interiores, tanto das mulheres, como dos homens, sob pena de morte. Foi no pátio dos gentios que se deram os acontecimentos de que agora vamos tratar.
Este local havia-se transformado numa verdadeira praça de comércio como se fosse um mercado público, onde estavam instalados os cambistas e os vendedores de animais para o sacrifício. Os cambistas cobravam elevadas taxas para efetuar a troca das diversas moedas dos peregrinos em moeda do Templo com a qual se pagava o imposto religioso anual e se compravam as vítimas para os sacrifícios. Os vendedores de animais vendiam-nos por preços abusivos. Era uma verdadeira extorsão organizada contra os romeiros. Os inspetores do Templo recebiam suborno para recusar animais trazidos de fora, alegando que eram defeituosos, e assim forçavam a compra dos mesmos ali naquele mercado. O fato mais surpreendente de tudo isto é que aquele comércio imoral e ilegal era totalmente controlado pela família de Anás, Sumo Sacerdote que ainda exercia grande influência política e religiosa na nação, mesmo depois de ter sido deposto e de ter sido substituído por Caifás, que era seu genro. Outra irregularidade que acontecia naqueles dias é que o povo havia aberto caminho através do pátio dos gentios, para encurtar distância entre certos pontos da cidade, e por ali transportavam objetos de um lado para outro. Deste modo aquele local não podia mais ser usado para oração, para meditação ou para devoção, que eram as verdadeiras finalidades da sua existência.
Então podemos entender que Jesus usasse a sua ira santa para mostrar a necessidade de restaurar a correta atitude de adoração a Deus, o que ele realmente veio para fazer. Ele irou-se pela exploração e pela opressão que faziam aos peregrinos que vinham com o propósito de adorar. Ele irou-se pela profanação do santuário de Deus e também, pela injustiça feita aos gentios, cujo espaço de adoração no Templo foi ocupado por homens perversos.
É oportuno notar a diferença de motivo da ira dos principais sacerdotes e escribas, e da ira de Jesus. Mateus 21:15-16 registra que eles se indignaram por ouvirem as crianças no Templo clamarem diante de Jesus: “Hosana ao Filho de Davi”, quando ele fazia maravilhas. Entretanto não se incomodavam com a gritaria dos cambistas e dos vendedores. Eles achavam tudo isso conveniente como fator de promoção do cerimonial do culto de adoração e daquela religiosidade exterior que significava tudo para eles. Eles devem ter ficado muito mais indignados quando Jesus afirmou que ele reconstruiria em três dias o Templo, quando ele fosse destruído (João 2:19). Mas, para Jesus, a maior causa de ira era aquele recinto sagrado ter sido transformado em covil de salteadores, quando, no propósito de Deus, ele foi estabelecido como casa de oração para todas as nações.
A ira do Cordeiro deve ter causado forte impacto não somente nos sacerdotes e nos escribas, mas também nos discípulos que tiveram ali uma nova experiência do caráter do Mestre, que certamente não esperavam. João explica que no momento eles compreenderam através das palavras do Velho Testamento, que ele estava tomado de zelo pelo nome de Deus, envolvido em todas estas cousas (cf. João 2:17). Este sentimento de Jesus explica a atitude zelosa de Elias no passado, quando pediu fogo do céu, porque a adoração ao Deus Jeová estava sendo violada (1Reis 36-39).
É importante saber o conceito que Jesus tinha do Templo. Aos doze anos de idade ele ensinava lá e afirmava estar tratando dos negócios de seu Pai. Na parábola do fariseu e do publicano que se passa naquele mesmo lugar, ele mostra a natureza justa de Deus que ouvia as orações de todos os do seu povo que ali o procuravam (Lucas 18:9-14). Agora ele o interpreta como casa de oração e via nele um lugar de ensino e de reflexão para toda a humanidade. Ele não desvalorizou e nem subestimou o Templo por tomar lá aquelas medidas disciplinares. Antes, o valorizou.
A igreja de Jerusalém tinha este mesmo elevado conceito daquele recinto sagrado. Em Atos 2:42-47 encontramos informações de que os primeiros batizados perseveravam diariamente unânimes no Templo, e perseveravam também na doutrina dos apóstolos, na comunhão, no partir do pão e nas orações. Para lá concorriam também os apóstolos com este mesmo propósito (Atos 3:1; 5:12).
Até num momento de calor emocional Jesus achou oportunidade para dar ensino sobre a verdadeira finalidade do Templo no propósito de Deus. Explicando que era para ser casa de oração para todos os povos, ele faz menção da profecia de Isaías 56:7, que diz: “também os levarei ao meu santo monte e os alegrarei na minha casa de oração; os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no meu altar, porque a minha casa será chamada casa de oração para todos os povos”. Sacrifícios e holocaustos não são mencionados aqui por Jesus, porque é ele mesmo quem havia de morrer para unir judeus e gentios num só corpo (João 11:51-52). À passagem de Isaías Jesus juntou a de Jeremias 7:11 que denuncia a transformação do Templo em covil de salteadores, mensagem pregada pelo profeta na casa de Deus nos seus dias.
A atitude de Jesus derrubar as mesas dos cambistas e as cadeiras dos vendedores não significa ira pecaminosa, pois ele não ultrapassou os limites do zelo num propósito sagrado. Mesmo usando um azorrague para expulsar homens e animais, ele não maltratou ninguém. Também ele não pode ser acusado de perder a mansidão ou a humildade.  Mansidão é a virtude de deixar Deus controlar as nossas forças. Mas o homem manso deve ser enérgico, quando Deus exige. Humildade não significa aceitar imposições contrárias à verdade para evitar problemas que devem ser enfrentados. Humildade é submeter-se ao propósito de Deus e tratar com o próximo de maneira coerente com esse propósito. O que precisamos entender é que Jesus deu um ensino por meio de uma parábola em ação, na qual ele é o principal personagem em cena. Este é um dos exemplos de como ele é capaz de ensinar. Ele veio para purificar o templo de Deus que é a sua igreja, por meio da sua obra expiatória. A sua vida é um ensino que se desenvolve num crescendo até ao ponto em que ele se deixa levar à cruz no maior exemplo de amor, e na maior resposta ao apelo de Deus, em obediência ao seu propósito. Com isto ele criou a adoração espiritual no verdadeiro templo de Deus que é o seu corpo glorificado, ou seja, a igreja, abrindo novo caminho pela sua carne para chegarmos à presença de Deus, purificados pelo seu sangue, e para o adorarmos em espírito e em verdade.
Depois do que aconteceu, os sacerdotes e os escribas procuravam matar Jesus porque o temiam, e porque os seus ensinos maravilhavam o povo.