sábado, 13 de abril de 2013

CAPÍTULO 3


CAPÍTULO  3

 

V .  1 - De novo entrou Jesus na sinagoga, e estava ali um homem

            que tinha ressequida uma das mãos.

V .  2 - E estavam observando a Jesus para ver se o curaria em dia

            de sábado, a fim de o acusarem.

V .  3 - E disse Jesus ao homem da mão ressequida: Vem para o meio.

V .  4 - Então lhes perguntou: É lícito nos sábados fazer o bem ou fazer

            o mal? salvar a vida ou tirá-la. Mas eles ficaram em silêncio.

V .  5 - Olhando-os ao redor, indignado com a dureza dos seus corações,

            disse ao homem: Estende a tua mão. Estendeu-a,

            e a mão lhe foi  restaurada.

V .  6 - Retirando-se os fariseus, conspiravam logo com os herodianos,

            contra ele, em como lhe tirariam a vida.

 

Nos dois últimos parágrafos que estudamos, Marcos focaliza dois incidentes entre Jesus e seus adversários fariseus. Vimos estes mesmos adversários anteriormente na casa de Mateus e na casa em que foi curado o paralítico que chegou carregado por quatro homens. Já desde os tempos em que o Mestre percorria com seus discípulos as terras da Judéia e batizava, os fariseus começaram a preocupar-se com ele, pois o seu ministério tinha maior êxito do que o de João Batista. Por isso Jesus retirou-se para a Galiléia, onde os fariseus não tinham a mesma autoridade e influência de que gozavam na Judéia.

Mas agora, no novo território, o seu ministério sofre uma verdadeira explosão com a pregação do evangelho acompanhada da expulsão de demônios e das curas que ele fazia. A partir daí os fariseus redobraram os seus cuidados. Eles temiam que Jesus fosse um líder popular que arrebatasse o povo, retirando a população das mãos deles. Achavam também que ele intentava fazer uma revolução contra o Império Romano, colocando todo o país em complicações político-sociais, econômicas e militares. Foram estes ciúmes que os levaram a uma perseguição austera e sistemática contra o Mestre. No verso 6 do capítulo 3, Marcos registra em seu Evangelho, como o plano dos fariseus já se encontrava perfeitamente definido com respeito às providências que eles planejavam tomar contra Jesus. À medida que o autor vai revelando o Filho de Deus com a sua autoridade e poder, ele vai também mostrando a reação das forças contrárias.

No pé em que se encontram os conflitos, Jesus demonstra a sua coragem ao enfrentar uma situação reconhecidamente difícil diante dos inimigos, mas que ele é perfeitamente capaz de dominar. É dentro de uma sinagoga, rodeado de observadores atentos que querem ver se ele vai efetuar a cura do homem da mão ressequida no sábado. A atual expectativa dos fariseus certamente está ligada à recente afirmação de Jesus, de que ele é Senhor do sábado.

Segundo os preceitos tradicionais, a cura daquele homem podia ser adiada porque ele não corria risco de vida. Mas Jesus que não se enquadra em tradições humanas, chamou o homem para o meio e, à vista de todos, dá início a um diálogo com os ortodoxos do judaísmo, pondo às claras tanto as intenções deles, como a intenção dele próprio, Jesus. Embora o texto não afirme literalmente, nós podemos concluir com toda certeza, que ele sabia o que se passava no coração dos seus observadores quando perguntou: “É lícito nos sábados fazer o bem ou fazer o mal? salvar a vida ou tirá-la?”

Com estas palavras o Mestre traz duas revelações muito pertinentes aos fatos. Em primeiro lugar, os fariseus não queriam que ele fizesse o bem no sábado, curando aquele homem. Em segundo lugar, eles conspiravam no sábado para tirar a vida de um homem inocente, que era Jesus. Não tendo como se justificar, seus adversários ficaram em silêncio. Esta questão de intenções é levantada em profundidade por Marcos a estas alturas da narrativa. Estão em jogo o bem e o mal, assim como a vida e a  morte. E o conflito atinge aqui o seu ponto crucial neste Evangelho.

Do verso 5 retiramos informações oportunas a respeito do caráter e da personalidade de Jesus. Notamos a sua reação de indignação perfeitamente controlada contra seus inimigos, a sua tristeza por causa daqueles corações endurecidos e a sua disposição de curar o homem da mão ressequida. No verso 6 assistimos à coalizão de duas forças do reino do mal, os fariseus e os herodianos, antes inimigos, mas agora aliados, conspirando contra o reino de Deus, em como matar Jesus.

 

 

V .  7 - Retirou-se Jesus com os seus discípulos para os lados do mar.

            Seguia-o da Galiléia uma grande multidão. Também da Judéia,

V .  8 - de Jerusalém, da Induméia, dalém do Jordão e dos arredores de

            Tiro e de Sidom uma grande multidão, sabendo quantas cousas

            Jesus fazia, veio ter com ele.

V .  9 - Então recomendou a seus discípulos que sempre lhe tivessem pronto

            um barquinho, por causa da multidão, a fim de não o comprimirem.

V. 10 - Pois curava a muitos, de modo que todos os que padeciam de qualquer

            enfermidade se arrojavam a ele para o tocar.

V. 11 - Também os espíritos imundos, quando o viam, prostravam-se diante

            dele e exclamavam: Tu és o Filho de Deus.

V. 12 - Mas Jesus lhes advertia severamente que o não expusessem à publicidade.

 

Depois dos últimos acontecimentos Jesus toma uma decisão cautelosa. Ele faz uma retirada estratégica, porque não queria dar oportunidade a incidentes que pudessem comprometer o seu ministério e precipitar certos acontecimentos antes do tempo devido. Embora os meios mais ou menos oficiais entrassem em conflito com ele, a sua popularidade junto ao povo em geral era crescente. Multidões de todas as partes vinham procurá-lo. As necessidades do povo eram tamanhas, que alguns se arrojavam contra ele e ele atendia a todos, curando, ensinando e expelindo demônios. As bandas do mar eram mais apropriadas para o seu trabalho, porque ofereciam maior comodidade para o povo e maior segurança para ele mesmo que podia entrar num barco e manter-se à distância, evitando ficar embaraçado e comprimido pela massa de gente ao seu redor.

Uma cousa era certa: ele precisava continuar o seu ministério até cumpri-lo cabalmente. Por isso afastou-se dos inimigos, recomendando ao povo que não fizesse publicidade em torno dele. Isto nos faz lembrar a profecia de Isaías que diz em 52:13 :  “Eis que o meu servo procederá com prudência”.

Mateus interpreta esta atitude de Jesus e o motivo da sua decisão, como cumprimento do propósito de Deus previsto para o Servo. Em seu relato paralelo ele cita a profecia de Isaías escrevendo:

“Eis aqui o meu servo, que escolhi, o meu amado,

  em quem a minha alma se compraz. Farei repousar

  sobre ele o meu Espírito, e ele anunciará juízo aos

  gentios. Não contenderá, nem gritará, nem alguém

  ouvirá nas praças a sua voz. Não esmagará a cana

  quebrada, nem apagará a torcida que fumega, até

  que faça vencer o juízo. E no seu nome esperarão

  os gentios” (Mateus 12:17-21; Isaías 42:1-4).

 

A conversão de gentios no mundo atual, dois mil anos depois que o Filho de Deus trouxe o seu evangelho, é prova de que ele soube conduzir o seu ministério muito bem, até o fim.          

   

V. 13 - Depois subiu ao monte e chamou os que ele mesmo quis,

            e vieram para junto dele.

V. 14 - Então designou doze para estarem com ele e para os enviar

            a pregar,

V. 15 - e a exercer a autoridade de expelir demônios.

V. 16 - Eis os doze que designou: Simão, a quem acrescentou o

            nome de Pedro;

V. 17 -Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, aos quais deu

           o nome de Boanerges, que quer dizer, filhos do trovão;

V. 18 -André, Felipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago,  filho de Alfeu,

           Tadeu, Simão o Zelote,

V. 19 -e Judas Eucariotes, que foi também quem o traiu.

 

A perpetuação dos ensinos de Jesus era um dos fatores primordiais da sua missão. Como iria ele entregar os seus ensinos que, posteriormente, deveriam ser repassados para o mundo todo? Deixar por escrito não foi o método que ele adotou. Ele preferiu escolher doze dos seus discípulos para imprimir em suas mentes e em seus corações a sua própria vida e, assim, formar neles um depósito para dali retirarem oportunamente as boas cousas e as transmitirem ao mundo, como seus porta-vozes. A sua visão e a sua cautela podem ser vistas nos passos adotados nesse procedimento: Em primeiro lugar ele subiu ao monte, onde passou a noite toda orando, antes de escolher os doze (cf. Lucas 6:12). Em seguida chamou os que ele mesmo quis. Com sabedoria e discernimento fez uma escolha soberana, subordinada tão somente às suas próprias intenções, completamente desligada de razões e influências exteriores. Depois designou os doze para estarem com ele. Não convinha que os seus discípulos ficassem expostos à influência dos escribas e fariseus. Eles precisavam apagar da memória o que haviam aprendido no passado, a fim de compreenderem  a atitude misericordiosa de Deus para com o pecador, que Jesus se empenhava em mostrar-lhes. E, para serem instruídos adequadamente, era preciso estarem sempre juntos com ele. Por último, designou-os para os enviar a pregar e exercer a autoridade de expelir demônios. Embora no momento eles não estivessem preparados para esta tarefa, o Mestre haveria de instruí-los, treiná-los e capacitá-los para uma missão de extensão mundial no futuro.

Mas como ficaria a continuação do seu ministério confiado àqueles homens imaturos, quando o noivo lhes fosse tirado? O Mestre então assume toda a responsabilidade sobre o futuro desempenho dos discípulos que escolheu. Nesta atitude diante deles, confiando-lhes os seus ensinos, enviando-os a pregar e a purificar almas, o Evangelho de Marcos mostra a autoridade de Jesus sobre o seu colégio apostólico.          Este é um quadro que prefigura a sua igreja, onde ele é a cabeça. O número 12  lembra as tribos de Israel e representa a formação de uma nova raça, o Israel de Deus do Novo Testamento (Gálatas 6:16).

Os discípulos de Jesus eram homens de caracteres os mais diversos. Por exemplo:

Mateus era publicano e destituído de sentimentos patrióticos.

Simão, o Zelote, como indica o próprio nome, era zeloso por sua pátria, pois pertencia a um partido nacionalista exaltado.

Simão Pedro estava sempre pronto para defender o Mestre.

Judas Iscariotes estava pronto para entregá-lo.

Bartolomeu, provavelmente Natanael, era um verdadeiro israelita, no qual não havia dolo.

Tiago e João, filhos de Zebedeu, tinham gênio tempestivo.

Mas havia um ponto de ligação comum entre eles, capaz de estabelecer a unidade entre todos, desfazendo qualquer diferença do passado, levando-os a um novo e perfeito relacionamento. É a presença de Cristo injetando-lhes uma nova vida bem diferente da que eles haviam conhecido até então na sua sociedade desunida e conflitante. Esta nova vida é figura da convivência na igreja e tem como característica fundamental o amor “agapë”, que os discípulos haveriam de exercer e ensinar no futuro.

 

V. 20  - Então ele foi para casa. Não obstante, a multidão afluiu de novo,

            de tal modo que nem podiam comer.

V. 21 - E quando os parentes de Jesus ouviram isto, saíram para o prender;

            porque diziam: Está fora de si.

V. 22 - Os escribas, que haviam descido de Jerusalém, diziam: Ele está

            possesso de Belzebu, e: É pelo maioral dos demônios que expele

            os demônios.

V. 23 - Então, convocando-os Jesus, lhes disse, por meio de parábolas:

            Como pode Satanás expelir a Satanás?

V. 24 - Se um reino estiver dividido contra si mesmo,

            tal reino não pode subsistir;

V. 25 - Se uma casa estiver dividida contra si mesma,

            tal casa não poderá subsistir.

V. 26 - Se, pois, Satanás se levantou contra si mesmo,

            e está dividido, não pode subsistir; mas perece.

V. 27 - Ninguém pode entrar na casa do valente para roubar-lhe os bens,

            sem primeiro amarrá-lo; e só então lhe saqueará a casa.

V. 28 - Em verdade vos digo que tudo será perdoado aos filhos dos homens: 

            os pecados e as blasfêmias que proferirem.

V. 29 - Mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo não tem perdão                       

            para sempre, visto que é réu de pecado eterno.

V. 30 - Isto porque diziam: Está possesso de um espírito imundo.

 

Estes fatos do ministério de Jesus aqui registrados estão relacionados com o crescimento dos conflitos produzidos pelos seus adversários escribas e fariseus. É muito provável que o banquete na casa de Mateus tenha dado lugar a um forte  pretexto para a aceleração dos conflitos futuros, pois ficou claro que este discípulo era amigo de toda aquela sorte de gente considerada desprezível, os pecadores e os publicanos.

Convém analisar agora o progresso desses conflitos desde o início, quando ele é insinuado na narrativa de Marcos. Depois da expulsão de um demônio na sinagoga de Cafarnaum e de tantos milagres que Jesus realizou naquele mesmo sábado; e depois da sua excursão pelas sinagogas da Galiléia e da cura daquele leproso que veio ao seu encontro, a sua fama cresceu tanto que despertou a atenção dos fariseus. Na cura do paralítico em Cafarnaum, eles arrazoavam em seus corações sobre a sua autoridade de perdoar pecados. No banquete na casa de Mateus eles questionavam a atitude de Jesus comer e beber com pecadores e publicanos. Na questão do jejum alguns aparecem pessoalmente para acusar seus discípulos de não jejuarem como os discípulos de João e os dos fariseus. No caso do sábado eles censuram o Mestre porque os seus discípulos colhiam espigas naquele dia. E na cura do homem da mão ressequida eles já conspiram com os herodianos sobre como lhe tirarem a vida. Estes fatos mostram um visível crescimento da agressividade dos fariseus e dos escribas. Agora, porém, o conflito atinge maiores proporções, porque eles tentam jogar contra Jesus tanto a opinião do povo, como ainda os seus próprios familiares.

A autoridade de Jesus e a excelência da sua doutrina demonstradas nos acontecimentos anteriores fizeram com que ele se destacasse sobremaneira, tanto aos olhos dos seus seguidores, como aos olhos do povo em geral. Então os escribas, movidos por um zelo fanático e sem entendimento da Lei de Moisés, resolveram tentar conseguir o apoio da população da Galiléia, pois nos tempos de Jesus eles não tinham controle sobre os judeus daquela região. Por isso começaram uma campanha de difamação contra o Mestre, levantando dúvidas sobre a sua pessoa e sobre o seu poder, dizendo que ele estava possesso de Belzebu, e que expelia demônios pelo maioral dos demônios. Deste modo faziam uma investida contra todo aquele ministério que impressionava o povo, especialmente pelas curas e pelas expulsões de demônios. É muito provável que os parentes de Jesus tenham sido influenciados pelos boatos, e por isso saíram para prendê-lo. Certamente eles não aceitaram a acusação dos escribas, mas demonstraram preocupação pelo seu estado mental.

Diante da incoerência daquelas acusações, Jesus chamou à parte os seus acusadores para esclarecer o falso conceito que eles tinham de Satanás: Ele não faz guerra contra os seus próprios subordinados, explicou, por meio de parábolas.

Se ele desencadeasse forças do seu reino contra si mesmo, certamente se destruiria. Portanto os escribas não estavam sendo coerentes ao afirmar que Jesus expelia demônios com o poder do maioral deles. Pelo contrário é o próprio Jesus quem veio para amarrar o valente Satanás, entrar em sua casa e retirar os bens que estão em seu poder. Esta obra o Filho de Deus faz com o poder do Espírito Santo, para libertar as almas prisioneiras do diabo. Por isso ele afirma que os seus inimigos estavam pecando contra o Espírito Santo ao atribuir a Satanás o poder para a obra de libertação que ele vinha realizando.

Quando o homem chega a um grau de perversão tal que a sua consciência não lhe permite mais reconhecer a diferença entre o bem e o mal, ou quando ele confunde as origens das forças do bem e das forças do mal, tal homem não tem possibilidade de reconciliação porque não permite a obra do Espírito em sua própria vida. Endurecendo o coração contra a Palavra, ele reluta contra Deus. E o Espírito não pode levá-lo à conversão. Nestas condições não haverá perdão para ele nem neste mundo e nem no porvir.

Portanto, confundir Jesus com o diabo, ou a sua obra com a obra de Satanás, é pecado imperdoável contra o Espírito Santo.

 

V. 31 - Nisto chegaram sua mãe e seus irmãos, e,

            tendo ficado do lado de fora, mandaram chamá-lo.

V. 32 - Muita gente estava assentada ao redor dele, e lhe disseram:

            Olha, tua mãe, teus irmãos e irmãs estão lá fora à tua procura.

V. 33 - Então ele lhes respondeu, dizendo: Quem é minha mãe e meus irmãos?

V. 34 - E, correndo o olhar pelos que estavam assentados ao redor, disse:

            Eis minha mãe e meus irmãos.

V. 35 - Portanto, qualquer que fizer a vontade de Deus,

            esse é meu irmão, irmã e mãe.

 

A ‘saída’ dos irmãos de Jesus com a intenção de prendê-lo depois de terem ouvido que a multidão se reunia de novo em torno dele deve significar que eles haviam-se retraído por causa dos boatos espalhados pelos escribas. E agora eles chegavam, quando Jesus falava sobre o pecado de blasfêmia contra o Espírito Santo. O mais notório neste quadro são os seguintes pontos: Primeiro, um novo conceito trazido por Jesus, o da família espiritual, constituída de pessoas unidas pela obediência ao Pai comum. Segundo, a superioridade da família espiritual, diante da qual os laços carnais de relacionamento familiar assumem importância secundária. Terceiro, o erro da mãe e dos irmãos de Jesus ao avaliarem a sua pessoa e o seu ministério, quando tentaram interromper o seu trabalho.