A MORTE DE JESUS
MARCOS 15:33-41 (Mateus 27:45-56; Lucas 23:44-49; João 19:28-30)
V.33 - Chegada a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra, até a hora nona.
V.34 - À hora nona clamou Jesus em alta voz: Eloi, Eloi, lama sabactâni?
que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?
V.35 - Alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: Vede, chama por Elias.
Chegada a hora sexta, que é o meio dia, houve trevas sobre a terra até a hora nona, que são três horas da tarde. Nesta hora clamou Jesus em alta voz: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” É neste momento que nos encontramos diante do acontecimento mais significativo da história da Redenção. Mas nunca poderemos compreender totalmente o significado destas palavras de Jesus, porque tudo o que se passou ali ele suportou sozinho, em meio à escuridão de trevas, separado de Deus. Podemos até entender que a sua agonia no Getsêmani foi uma antecipação desta hora que é o ponto central da cruz. Mas que idéia podemos fazer do desamparo que ele sentiu de Deus? Nenhuma explicação satisfará melhor do que a opinião tradicional, de que naquela hora de trevas a ira de Deus caiu sobre Ele, o que significa que aquela comunhão transparente com o Pai, desfrutada desde a eternidade, foi quebrada. Se o inferno é em essência a separação eterna de Deus, então ele sofreu ali toda a angústia do inferno. Ele estava carregando os nossos pecados, como um cordeiro, no sacrifício. Ele se fez maldição em nosso lugar. Ali ele foi feito oferta pelo pecado, a nosso favor. Se havia naquela hora uma barreira entre o Pai e o Filho, só podia ser por causa do pecado, mas ele não conheceu pecado. Portanto, só podia ser o nosso pecado, que custou para Ele aquela agonia.
Alguns dos que ali estavam, ouvindo o que ele falava, diziam: “Vede, chama por Elias”.
V.36 - E um deles correu a embeber uma esponja em vinagre e,
pondo-a na ponta de um caniço, deu-lhe de beber, dizendo:
Deixai, vejamos se Elias vem tirá-lo.
V.37 - Mas Jesus, dando um grande brado, expirou.
V.38 - E o véu do santuário rasgou-se em duas partes, de alto a baixo.
V.39 - O centurião que estava em frente dele, vendo que assim expirara, disse:
Verdadeiramente este homem era Filho de Deus
V.40 - Estavam também ali algumas mulheres, observando de longe;
entre elas, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, e
Salomé;.
V.41 - as quais, quando Jesus estava na Galiléia, o acompanhavam e serviam; e,
além destas, muitas outras que haviam subido com ele para Jerusalém.
Quando Marcos inicia a narrativa do seu Evangelho, ele dá ênfase às seguintes palavras: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus”. E quando chegamos aos capítulos 14, 15 e 16 vamos tomando consciência de que ele está apresentando o resumo final da história. E, pouco a pouco, a essência do Evangelho vai-se consubstanciando em três fatos indispensáveis e inseparáveis, que são: a crucificação, a morte, e a ressurreição de Jesus. O que Marcos pretende com o seu relato é fazer-nos compreender os fatos e as razões que levaram o Filho de Deus a esta morte na cruz, seguida da sua imediata ressurreição. Depois de exposto todo o drama que conduziu à tragédia final, a ressurreição aparece como algo surpreendente. Tão surpreendente quanto ela, é o maior milagre realizado por Deus, a Redenção, sem a qual todos nós teríamos permanecido eternamente naquela tragédia, sem esperança de salvação. Na realidade, é isto que se passa com aqueles que não compreendem o evangelho, ou não têm oportunidade de conhecê-lo. Pela providência divina tudo foi registrado, a fim de que creiamos que Jesus Cristo é o Filho de Deus e, crendo, tenhamos vida em seu nome (cf. João 20:31).
Conforme se desenrolam os acontecimentos na narrativa de Marcos, percebemos que a morte de Jesus foi resultado da rejeição apontada bem cedo no seu ministério. Foi numa sinagoga da Galiléia, logo no capítulo 3, quando ele curou o homem da mão ressequida num sábado, que os fariseus e os herodianos entraram em conspiração, para lhe tirarem a vida. Aqui eles deram início ao conflito que atingiu a sua família, estendeu-se aos habitantes de Nazaré, penetrou a esfera do poder temporal de Herodes, envolveu a mentalidade geral nas questões do divórcio, do tributo e de doutrinas como a dos saduceus, avolumou-se nos confrontos diretos com os líderes judeus após a purificação do Templo e culminou com a crise no seu ministério, quando um dos discípulos manifestou-se como traidor, e os outros todos desertaram. Totalmente rejeitado, ele se encontra agora pendurado na cruz, para onde marchou sozinho. Embora a narrativa nos dê todas estas informações, e ainda as explicações de Jesus da necessidade de se cumprirem as escrituras, o contexto também mostra que a sua morte satisfazia a necessidades mais profundas. Se por um lado a morte é bem caracterizada como resultado de articulações humanas de origem diabólica, a ressurreição fica bem evidenciada como uma providência necessária da parte de Deus. Pois o ambiente em que transcorreu o ministério de Jesus estava tão pervertido que era necessária a intervenção divina no sentido da “transformação”. Esta é, portanto, a primeira necessidade mais profunda da morte de Jesus – a transformação. Perversão é a condição geral de todos os homens. Todo o conflito que Jesus suportou, inclusive as blasfêmias e insultos que ouviu na cruz, é resultado deste estado de cousas. Até mesmo a falta de capacidade dos discípulos compreenderem o Mestre enquadra-se nesta situação.
Considerando tudo isto, entende-se que Marcos não deseja apresentar apenas o lado negativo da questão. Antes ele está apontando o remédio ali mesmo, ao lado dos enfermos. O próprio Evangelho que ele escreve, resultado de anotações das reminiscências de Pedro, é prova da transformação ocorrida no meio dos discípulos que cedo passaram a produzir o fruto, o trabalho incansável no sentido de transformar a humanidade. Em virtude de em todos os tempos os homens serem o que são, a necessidade da morte de Jesus estende-se a todos, proporcionando a todos a oportunidade da transformação.
Mas há outro ponto a considerar, que é a justiça de Deus. Também sob este aspecto, a morte de Jesus era absolutamente necessária. Este foi o sacrifício perfeito que agradou a Deus, conforme Hebreus 10:5-10. E foi também o sacrifício representativo de todo o povo de Deus, o Justo pelos injustos, para nos conduzir a Deus (cf. 1Pedro 3:18), “carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos aos pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas fomos sarados” (I Pedro 2:24).